sexta-feira, 22 de novembro de 2013

O sopro dos ventos de Junho na Universidade: as mobilizações por Democracia na USP - outubro/novembro de 2013

O início da mobilização
No dia 1° de Outubro, deu-se um importante passo na luta política por democracia na USP. Foi realizado um ato unificado das três categorias - Funcionários, Docentes e Estudantes - exigindo a democratização dos processos decisórios da universidade. A USP, uma das mais antigas universidades do país, ainda possui uma estrutura arcaica e antidemocrática que dificulta, ou melhor, bloqueia, o diálogo de sua direção com a comunidade universitária. Qual o resultado disso? A livre condução da universidade sob a lógica do capital e a serviço da elite econômica e política do país, impedindo qualquer passo na construção de uma universidade democrática e popular.
Para se ter uma ideia do quão autoritário são os processos decisórios na USP, nem 3% da comunidade universitária pode votar para Reitor, sendo o Conselho Universitário (CO), composto majoritariamente por professores titulares, quem decide os três candidatos ao reitorado. Quando se pensa que não pode ser mais antidemocrático e restrito o processo de eleição, a decisão final se dá através da nomeação feita pelo governador do Estado que escolhe o reitor através da lista tríplice apresentada por esse conselho.
Os estudantes, os funcionários e os professores há tempos se cansaram dessa estrutura conservadora e excludente de votação. Por isso, a pauta de diretas para reitor é um acúmulo de décadas que vem sendo sistematicamente imobilizada pelos de “cima”, ou seja, pela burocracia universitária. E como é barrada essa mobilização? Através de uma forte repressão e perseguição daqueles que ousam lutar. Não esquecemos que na greve de 2011, oito estudantes foram expulsos da USP com base em um regimento disciplinar da época do regime militar!
Por isso, a última reunião do Conselho Universitário, que culminou na ocupação da reitoria, foi apenas mais uma forma da elite burocrática da USP burlar as demandas da comunidade universitária, fazendo alguns  “retoques” que não trazem a mudança necessária  na universidade. Nessa reunião, foi decidido que não haverá mais o 2º turno (no qual somente o CO votava para reitor) e a estrutura da votação no 1º turno, já bastante exclusiva, foi mantida. Foram criadas, ainda, a obrigatoriedade de inscrição de chapas dos candidatos a reitor e um plebiscito à comunidade universitária, com resultado a ser divulgado cinco dias antes das eleições se iniciarem (de caráter apenas consultivo!). A Reforma do Estatuto da USP ficou como indicativo para a gestão do próximo reitor, a ser discutida pelo CO em 2014.
A decisão não contemplou as revindicações da comunidade universitária, afinal, não basta um verniz democrático mas uma democracia que de fato possa servir para realizarmos as mudanças que queremos ver na universidade. Diante da intransigência e a total falta de diálogo do CO, o ato terminou na ocupação da reitoria e, após Assembléia Geral, os estudantes deliberam Greve.
O movimento e suas pautas
Após a deliberação de greve, vimos crescer a mobilização por vários cantos da USP: cursos que não tinham um histórico recente de mobilização, como a a Geologia e a Farmácia por exemplo, permaneceram uma semana em greve. A Física aprovou greve com “cadeiraço”, a Educação Física entrou em greve e conseguiu importantes conquistas internas. A mobilização favoreceu também o debate político em alguns cursos, como na já citada Geologia, onde os estudantes do curso conseguiram realizar vários debate, entre eles o de Universidade Popular. Na greve, aprovaram-se cinco eixos que dialogaram com a bandeira geral de democratização da universidade, que foram: Diretas para Reitor, Estatuinte Livre Soberana e Democrática, Devolução dos Blocos K e L, Cotas e Não a Repressão.
A ocupação e a decisão de greve tiveram como estopim a reunião do CO e a exigência de Diretas para Reitor. Mas não podemos esquecer da existência de outras demandas, como acesso e permanência estudantil, que dialogam diretamente com  a verdadeira democratização da universidade. Esses eixos foram a devolução dos blocos de moradia estudantil K e L e a aprovação do PL de cotas sociais e raciais. Eles foram deliberados na primeira assembléia estudantil pós-ocupação, apesar do pouco empenho de alguns setores estudantis, o que demonstra como é necessário lutarmos e disputarmos o lugar do acesso e da permanência nos fóruns do movimento.
E por que esse eixo dialoga tanto com a verdadeira democratização da universidade? Para nós, da Juventude LibRe, só haverá democracia de fato quando a universidade abrir suas portas para a população! Se não combatermos o caráter elitista e excludente da universidade, não há sentido em falar de democracia! Por isso as lutas travadas no movimento universitário não devem ter um fim nelas mesmas mas sim romper com o caráter que infelizmente permeia não só a USP mas a totalidade das universidades públicas do Brasil - que são a aversão à periferia e à juventude proletária, a produção de conhecimento para o mercado e a falta de diálogo com as demandas da sociedade. A luta por democracia não pode ser desvinculada da luta por uma universidade popular, que rompa com a lógica da universidade do capital, e que se volte para o povo, em vez da elite, e para sociedade, em vez do mercado e das fundações privadas. Para tanto, a democracia deve estar presente não só na possibilidade de votar, mas também no acesso e na permanência, na produção e destinação do conhecimento acadêmico.
Um balanço
A mobilização que aconteceu na USP nesses dois últimos meses nos lembrou que é possível, construindo um movimento coeso e propositivo, avançar nas lutas e conquistar vitórias. Infelizmente, ela não teve o fim que desejávamos. A reintegração de posse da reitoria aconteceu no dia 12/11, e dois estudantes foram presos arbitrariamente e correm risco de serem processados. A negociações, que estavam sendo feitas com a reitoria, emperraram e ainda não sabemos qual futuro terão.
Muitos fatores contribuíram para esse desfecho indesejado. De um lado, o movimento foi se esvaecendo com a dificuldade de diferenciarmos o que desejávamos do que poderíamos de fato conquistar. Sem uma clareza estratégica das possibilidades de vitória que a greve tinha, perdemos tempo e energia muito valiosos em discussões tais quais se teríamos como eixo “diretas pra reitor” ou “governo tripartite”. As pautas foram sendo disputadas na lógica da “marcação de posição” entre as organizações.
Visualizando essas questões, nós, como estudantes e militantes, podemos nos perguntar: como poderíamos ampliar a mobilização estudantil e tornar a luta sempre capaz de se renovar? Como fazer com que a greve não termine com repressão e refluxo do movimento? É chegada a hora do movimento estudantil se propor uma reflexão sobre suas estratégias e práticas, para que possamos avançar nas lutas e também nas conquistas. Vemos, cada vez com mais clareza, a falta de um horizonte estratégico comum que norteie e dê sentido para as nossas lutas e revindicações no presente. É o momento de aprofundarmos o debate de que universidade de fato queremos, para que possamos - com um projeto de universidade formulado - partir para a ofensiva.
O saldo final não é negativo, pelo contrário, provamos para muitos que  o movimento estudantil tem força, a final, essa foi a maior greve em cinco anos, desde 2007. A maioria dos estudantes que se envolveu nesse movimento nunca tinha participado de uma mobilização dessa proporção. Partindo da ideia de que todo ato histórico deixa - seja lá o seu resultado - marcas nos seus agentes, quem sabe não possamos, munidos agora da experiência recente, aprofundar e amadurecer nossa atuação? E, por que não, possamos compreender a urgência histórica de voltarmos nossos olhares para o mesmo horizonte? Lutamos para que seja o da Universidade Popular.
 Juventude Liberdade e Revolução 
22/11/2012

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Um junho que prossegue...



Foto: Ramiro Furquim/Sul21

“Não é por vinte centavos”...

Há algo de novo nesse junho que não acabou. O projeto desenvolvimentista – sustentado pela burguesia, os monopólios e o latifúndio – tem como centro a maximização dos lucros, passando por cima de direitos fundamentais, como moradia e transporte. Contrariando os discursos dos governos que pintam um Brasil em grande desenvolvimento - com ampla distribuição da riqueza, democracia e justiça social - a juventude, aliada a amplas camadas populares, saiu às ruas expressando sua indignação. A juventude brasileira tem mostrado que não quer ver seu transporte, sua educação, seu lazer, sua arte, sua vida, transformados em mercadoria, indicando um caminho para uma vida sem catracas: a mobilização popular. Mobilização que tem sido criminalizada e reprimida pelas polícias e até exército, mostrando a face antidemocrática deste projeto de sociedade.

Somos estudantes, e temos muito a ver com tudo isso!

Neste contexto de lutas populares a disputa que novamente se abre é de projeto de sociedade. A universidade não está isenta desta disputa. Lutar pelo caráter público da universidade é se opor à ingerência cada vez maior da iniciativa privada em nossa formação e produção de conhecimento. Para nós, a única forma de se contrapor ao projeto privatista em curso é apresentar um projeto alternativo e popular de universidade, para além da lógica do capital.

O Movimento Estudantil precisa de estratégia política!

Nos princípios da década de 1960 – anos anteriores ao golpe empresarial-militar – o movimento estudantil brasileiro se engajou na construção de um projeto de educação universitária que respondesse às demandas das camadas populares, juntando-se aos trabalhadores na luta pelas reformas de base (reforma agrária, reforma urbana, reforma educacional, etc.). Neste período, construíram-se Seminários Nacionais Pela Reforma Universitária, que tinham como objetivo promover uma discussão sobre para que(m) deve servir o conhecimento produzido nas universidades públicas. Em tais seminários se definiu que a luta universitária não deveria se restringir às demandas da universidade, mas sim responder às demandas populares como um todo.

Buscamos resgatar essa luta, construindo um projeto de luta por uma universidade popular.

Para tal construção, temos como tarefa imediata a defesa intransigente do caráter público de nossas universidades, e a isso entendemos que ensino, pesquisa e extensão devam ter financiamento 100% público e que devam servir aos interesses do povo, sem sofrer ingerências da iniciativa privada.
Propomos assim, o fortalecimento de movimentos por uma universidade popular construídos de baixo para cima. Nós construímos e tivemos uma série de experiências dentro e fora da UFRGS, dando força para iniciativas como o Grupo de Trabalho Universidade Popular (GTUP), bem como a diversos projetos de pesquisa e extensão popular, sempre respeitando suas autonomias.

Para que(m) serve um DCE?!

Acreditamos que a luta por uma universidade popular é uma luta que deva ser travada em várias frentes. Devemos, desde baixo, fazer um trabalho de formiguinha, construindo espaços de diálogo junto aos estudantes –especialmente os que dependem de assistência estudantil, moradores da casa de estudante, estudantes trabalhadores, mães, cotistas – para junto a estes construir agendas de lutas, mobilizações e organização. E igualmente estarmos presentes nos debates acerca das entidades, como Centros e Diretórios Acadêmicos, Executivas de curso e o Diretório Central dos Estudantes. Tanto o DCE como as demais entidades devem ser ferramentas que impulsionem essas lutas e possam ser espaços democráticos, não só de representação, mas fundamentalmente de participação dos estudantes.
Neste momento eleitoral, é responsabilidade nossa dar uma resposta à disputa que se apresenta. Diante da conjuntura política que vivemos com a proximidade da copa do mundo e à intensificação das lutas populares, é nosso dever refletir sobre esse processo. Devemos identificar quem esteve ao lado das classes populares nas mobilizações e quem esteve defendendo o projeto desenvolvimentista dos governos. Devemos igualmente identificar aqueles que estiveram ombro a ombro conosco e com os estudantes pobres nas lutas próprias da universidade.
Se fizermos essa reflexão, constataremos que os companheiros que hoje compõem a chapa 1 - “Nada será como antes...” - estiveram construindo as mobilizações pelo transporte público de qualidade, pelas ações afirmativas, contra a resolução 19, pelos espaços estudantis, entre outras. Entendemos que, mesmo com uma gestão passível de críticas em vários aspectos, é notório o esforço dos companheiros para aprimorar o modelo de funcionamento da entidade e sua intransigente luta pelo caráter público de nossa universidade.
Dentre as opções que se apresentam, é a chapa 1 a única capaz de manter o DCE nestas trincheiras e ainda evitar o retrocesso de uma possível vitória de setores que apoiam o projeto desenvolvimentista, privatista e antidemocrático de universidade e sociedade.
Nesse momento, privilegiaremos outros espaços em que atuamos, como grupos de extensão popular, cursinhos populares, entidades estudantis de base, movimentos sociais, entre outros, e por isso nossas organizações decidiram não compor este ano nenhuma chapa para o DCE. Entretanto, de forma independente, nossa posição é chamar nossa militância, amigos e simpatizantes a votarem na chapa 1 - “Nada será como antes...”, por um DCE independente das reitorias e governos, que consiga superar seus limites e fragilidades na práxis da luta por uma universidade pública e popular.

Saudações comunistas!

Porto Alegre, 13 de novembro de 2013.

Juventude Comunista Avançando (JCA)

Juventude Liberdade e Revolução (LibRe)

terça-feira, 29 de outubro de 2013

O bagulho por lá tá sinistrão

No dia 24/06/2013 o Rio de Janeiro vivia seus dias de descalabro: a favela parecia finalmente ter descido o morro pra tomar as ruas junto da juventude que já se mobilizava em torno da pauta pela redução das tarifas no transporte público. A coisa ficou feia pro governo Cabral. Faltando menos de uma semana pra final da Copa das Confederações no Maracanã (estádio símbolo da cidade símbolo do Brasil), a Cidade Maravilhosa anoitecia com odor de sangue e chumbo.

Esse foi o momento em que o Estado burguês mostrou sua faceta mais implacável: 13 moradores do Complexo da Maré foram assassinados pelos "faca na caveira" do BOPE. Ver uma turba de favelados parando a Avenida Brasil e saqueando lojas era tudo o que não podia acontecer naquele momento. De repente o mundo iria descobrir que as desigualdades sociais no nosso país ainda são gritantes, mesmo os últimos governos tendo alardeado por aí que somos uma "potência emergente". Não, isso não podia acontecer. Não no RJ. Não no meio da Copa das Confederações.

Outro fato, acontecido 23 dias após a Chacina da Maré, merece ser observado...

Durante um protesto na Zona Sul do Rio, lá pelas bandas de Ipanema e Leblon, uma galera arrebentou a vitrine da Toulon (loja que vende artigos luxuosos, pra gente rica que gosta de gastar R$10.000 numa bolsa chique), e espalhou os manequins da loja na rua. Isso parece ter sido um soco no ego da burguesia carioca. No dia seguinte, a cúpula de segurança do estado se reuniu, e prometeu dar um ponto final definitivo na baderna. Durante todo o dia 18/07 as televisões transmitiram as "terríveis e chocantes" imagens de manequins jogados na rua, vandalizados e atropelados pelos vândalos ogros. No final do dia, o Jornal Nacional fez uma comovente reportagem onde mostrava funcionários da loja pintando a mensagem "Só o amor constrói" na frente da loja, e velhas senhoras burguesas distribuindo flores e pedindo paz. Imediatamente o fato passou a ser ironicamente chamado de "Chacina da Toulon"... O ridículo da situação acabou expondo a contradição do Estado burguês: os manequins da Toulon valem mais do que a vida dos 13 mortos da Maré.



Mas o que a Chacina da Maré e a Chacina da Toulon têm a ver?

Antes de responder a essa pergunta, é preciso fazer um raio-x da juventude que foi vanguarda das jornadas de junho. Vários sociólogos e pesquisadores parecem concordar que a camada social que impulsionou inicialmente essas manifestações é formada majoritariamente por jovens com educação superior, mas que não vislumbram boas oportunidades e realização pessoal no mercado de trabalho. Além disso, são jovens que não se sentem representados pelo atual sistema político e pelos partidos que temos aí, ao mesmo tempo em que esperam mudanças profundas tanto na política quanto nos serviços básicos prestados pelo Estado (transporte, saúde e educação). A luta contra o aumento das tarifas serviu como fio condutor que canalizou a revolta dessa galera. Obviamente que eles não são os únicos que foram pras ruas no auge das manifestações. Ao longo daqueles agitados dias de junho, se juntaram a eles tanto a classe média tradicional, quanto setores mais proletarizados e pauperizados do povo. Mas são esses jovens que constituem a espinha dorsal das jornadas de junho.

Fato é que, a massificação das manifestações lhes trouxe uma lição muito importante: temos pouca liberdade pra protestar nas ruas. A PM está sempre reprimindo os protestos de rua, independente da nobreza das reivindicações. Pra quem está na luta há tempos, isso não é novidade alguma. Mas pra quem teve somente agora a primeira experiência de sair de casa pra expressar sua revolta, isso é uma coisa que indigna e põe em xeque a credibilidade das instituições... Especialmente da polícia. Quem esteve presente no ato do dia 17/06 em São Paulo irá se lembrar da palavra de ordem que saía espontaneamente da boca do povo: "que coincidência!!! não tem polícia, não tem violência!!!".

É de se considerar a possibilidade de que a violência policial tenha criado um vínculo de solidariedade - ainda que simbólico e muito frágil - entre esse setor da população e o povo pobre e massacrado da periferia. A expressão maior desse vínculo foi a campanha "Cadê o Amarildo?" que se alastrou de forma incrível pelas redes sociais, e colocou o governo Cabral contra a parede. Pela primeira vez um governo estava sendo questionado nacionalmente por aquilo que o Estado faz todos os dias: exterminar pessoas pobres da periferia (em sua maioria negros e jovens). Igualmente, pela primeira vez a bandeira da desmilitarização da PM saiu dos círculos restritos da intelectualidade de esquerda para se tornar uma coisa discutível pelo conjunto da população.

Não se pode ignorar a pedagogia das ruas. Ela tem o poder de mostrar, mesmo pros mais alienados, que "o bagulho lá tá sinistrão".

Fica como dica de expressão artística dessa conjuntura absurda e surreal, a música "A Maré tá cheia", do coletivo Anarco Funk... Se pá eles conseguiram pegar a essência da coisa toda que tá rolando. Daqui uns anos, quando formos contar essa história pros nossos filhos e netos, é bom que a gente coloque essa música de trilha sonora de fundo.


segunda-feira, 21 de outubro de 2013

A LibRe e a Cultura

No último sábado (19-10) nós da Juventude LibRe realizamos o lançamento da “Campanha Por Mais Cultura Em Cotia”. Os militantes da LibRe têm um histórico cultural extremamente rico. As atividade culturais nos bairros do Mirante da Mata, no Jardim Japão e no Caputera (todos em Cotia-SP) e tantas outras comprovam isso. Os shows de RAP, os saraus, as oficinas, tudo pra reforçar que – como diria nosso companheiro Uruguaio – “a cultura é uma luta popular de resistência”. Sabemos que nas periferias há muitos talentos escondidos e que na cidade de Cotia não há espaços públicos para produção artística, então resolvemos iniciar essa campanha junto a outros artistas e moradores da região.

Folder da campanha lançada pela Juventude LibRe: queremos MAIS CULTURA EM COTIA!!!

Quanto às iniciativas da prefeitura relacionadas ao tema vemos poucas, e quando elas acontecem sempre são tentativas de nos impor uma cultura. Trazer peças de grandes grupos teatrais é legal, mas abrir espaço para que os grupos da cidade possam mostrar seus trabalhos é muito importante. E os shows de bandas conhecidas? Nós adoramos sim, isso é verdade. Mas será que alguém pensou nas bandas, duplas, cantores, que tentam se firmar na cidade onde nasceram e foram criados? Pois é! Existem artistas bons que não têm espaço pra desenvolver seus trabalhos. Eles são privados de se apresentar, e nós somos privados do direito de apreciar seus trabalhos. Os dançarinos, por exemplo, não possuem espaços dignos pra ensaiar, muito menos pra se apresentar. Poetas, pintores, grafiteiros, e tantos outros artistas são carentes de espaços pra produzir e expor seus trabalhos. E isso não é de hoje! 

Em 2011 nós da LibRe realizamos uma série de colagens questionando o fato de não termos centro culturais em Cotia, nem sequer um Teatro Municipal (apesar dos altos valores destinados à Secretaria de Cultura). Seguimos questionando! Os representantes políticos citaram que iriam tomar providências, mas até agora nada foi feito.



Campanha Por Mais Cultura Em Cotia

Depois do dialogo com muitos artistas da região, resolvemos fazer um grande evento contendo todos os tipos de arte. Desde esculturas e pinturas, até músicas de diferentes estilos, danças, teatro, poesia. Porém no dia do lançamento uma surpresa nos ocorreu: A PRAÇA TINHA VIRADO ESTACIONAMENTO. Mas se "A praça é do povo! Como o céu é do condor, é o antro onde a liberdade cria águias em seu calor” (como dizia Castro Alves) o que fazer agora? Infelizmente não teve jeito, uma praça que deveria ter bancos e artistas, ao invés disso tinha carros. Os artistas locais ficaram sem chão, ou melhor, sem palco.

A praça da matriz amanheceu cheia de carros bem no dia do lançamento da Campanha por Mais Cultura em Cotia. Coincidência? Fica a dúvida.


Apesar do inédito acontecimento não nos desanimamos. A atividade ocorreu em frente a uma banca de jornal localizada ao lado da praça e recebemos o apoio da população e dos comerciantes que se indignaram com o novo “estacionamento”. As pessoas que passavam na rua pararam pra olhar, outras interagiram, as crianças não queriam mais sair de perto. Muitos se surpreenderam com a qualidade dos artistas que se apresentaram, mostrando que a cultura popular é riquíssima e que na periferia tem muito artista bom. Foi um momento pra que os artistas se conhecessem melhor, divulgassem seu trabalhos, protestassem contra a atual política cultural da cidade de Cotia, e proporcionar aos moradores da cidade um momento de lazer ao qual se identificam.

Segue as fotos da ocupação da praça que realizamos. Teatro, hip-hop, reggae, rock, poesia, artes plásticas: tudo tem espaço no nosso caldeirão cultural! 



Galera do teatro marcando presença no rolê

Carlinhos, grande poeta popular de Cotia, também apareceu pra dar o seu apoio!


Hip-hop ou reggae? Tanto faz! A gente mistura tudo!

Só nos passinhos de break.


Hip-hop, sempre presente no rolê.

Os roqueiros também tão envolvidos aí na parceria! Vamo chegá galera.

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Sua maior expressão de poder é o amor

            Na última terça-feira (17/091/13) a Juventude LibRe esteve presente na palestra da ativista política Ericka Huggins, ex-lider do Black Panther Party for Self-Defense (Partido dos Panteras Negras Em Legitima Defesa), organizada pelo recém-formado Coletivo de Estudantxs Negrxs da USP para falar de sobre preconceito racial e sobre as classe sociais. A atividade foi o marco da fundação do Coletivo de Estudantxs Negros da USP. Voltando à falar da Ericka, poderíamos resumi-la como FODA, mas pra que todos saibam melhor quem ela foi tentaremos fazer um breve resumo de sua história, e em seguida relataremos como foi a atividade.
Ericka Huggins e o Black Panther Party
Ericka começou sua militância em 1963, participando da Marcha em Washington, e seguiu comprometida com o movimento global pelos direitos humanos. Entrou para o Partido aos 15 anos de idade, logo largou a escola pra se dedicar cada vez mais à sua luta (ela nos aconselhou “não façam isso! Estudem, se apliquem e voltem às suas comunidades para ajudar os teus!”) Em 1969, aos 18 anos, ela se tornou um dos líderes da célula do Partido dos Panteras Negras junto ao seu marido John Huggins em Los Angeles. Três semanas após o nascimento de sua filha Mai, Ericka ficou viúva aos 19 anos, quando seu marido John Huggins, junto com Alprentice "Bunchy" Carter, foi morto a tiros no campus da UCLA. Mesmo com todas as dificuldades continuou no Partido, e segue lutando até hoje. Voltou à escola, formou-se e passou a acredita que a educação é uma arma revolucionária, assim como a cultura.



Se perguntarmos à qualquer negro que decidiu lutar por seus direitos uma referência, eles responderão: Partido dos Panteras Negras - até eu responderia isso - pois mesmo com referências nacionais como o Zumbi dos Palmares (que sim, é uma grande referência, não podemos esquecê-lo de maneira alguma), nos Panteras temos exemplos de como utilizar da ideologia e de noções de organizativas específicas. A principal finalidade do grupo era patrulhar os guetos e proteger os moradores da violência policial. Huey Newton um dos fundadores aprendeu todo o Código Penal da Califórnia, assim, utilizavam da legislação (através de citações) e de armas para se defender. Além disso, influenciados pelo marxismo, os Panteras Negras defendiam o socialismo como modelo político e o aplicavam nos bairros em que atuavam. Mais que a defesa das comunidades, o partido também mantinha escolas de formação política e treinamento de artes marciais para crianças e jovens, um programa de segurança alimentar para famílias mais pobres, defendiam a isenção de impostos e um projeto de reparação financeira da “América Branca” pelos séculos de exploração, também o fim da humilhação e genocídio da população negra.
Centenas de pessoas e a atenção voltada à uma mulher negra. “Eu vejo você! – Eu me sinto vista!”
Nossos dias geralmente começam assim: Acordar cedo, fazer nossas tarefas domésticas, trabalhos, estudos e correr contra o tempo pra sobrar um momento pra participar de atividades maravilhosas como essa. Tomando conhecimento da atividade horas antes, ignoramos qualquer lógica e fomos. Chegando lá o primeiro choque, o local estava lotado, já não havia onde sentarmos, todas aquelas pessoas queriam ver e ouvir uma MULHER NEGRA. Sentamos então nas escadarias, ao olhar pro lado muitos negros, muitos representantes da periferia.

A emoção já começa na hora que a Ericka entra no auditório, todos a aplaudindo de pé em seguida os braços esquerdos levantados, e seus comentários inicias bem humorados criaram um ambiente familiar e aconchegante. Ela nos pede pra acolhermos nossos companheiros que ainda não estavam acomodados, e logo diz que esse é o “espírito da coisa”, sejamos como uma família então. Passa a falar sobre suas experiências pessoais e foram poucas as pessoas que conseguiram segurar o choro. Os choros vieram com a identificação, principalmente das mulheres negras que estavam presentes, mas não nos faltaram momentos pra sorrir. Ericka disse que a felicidade é necessária pra lutar “por que se não de onde vamos tirar força pra resistir?”.




Num ato de humildade fala sobre a realidade dos negros no Brasil – sim, ela pesquisou! - Huggins cita acontecimentos como o genocídio da juventude negra da perifeira, os sacrifícios que os negros passam pra entrar na universidade, a perseguição à religiões de matrises africanas. Afirma a importância da mulher na luta contando que em certos momentos só haviam mulheres em determinados núcleos, pois a polícia perseguia primeiro os homens. Disse que o machismo era presente, mas eles o combatiam diariamente, mulheres “pegavam em armas” e homens “trocavam as fraudas”. E sim, as mulheres sofriam muito, mas não desistiam. Lutavam da mesma forma que os homens, as divergências internas haviam e eram superadas através do dialogo.

Coloca a questão da educação como um dos carros chefes na mudança social, nos pediu que mesmo que estudemos muito, nos especializarmos, que voltemos às nossas raízes. Que não devemos esquecer dos bairros onde crescemos, que devemos lutar por melhoras lá também. Considera de todas as ações dos Panteras Negras a criação de escolas algo mágico, escolas que algumas delas existem até hoje. “Na escola ensinávamos os alunos à pensar, e não o que pensar, mesmo que isso pudesse se voltar contra nós um dia. Falávamos das história dos negros, sem mentir, nem nos lamentarmos. Simplesmente não queríamos que nossas crianças vivessem na mentira, queríamos que elas soubessem por que viviam daquela forma.” 


Ericka nos fala sobre o café da manhã que ofereciam às crianças das perifeiras, conta que mesmo se estivessem cansados ou tristes, no frio ou calor, o café acontecia – “não haviam desculpas válidas”. Também nos fala sobre a distribuição de alimentos (o que no Brasil poderíamos chamar de sexta básica). Bem humorada diz que o governo passou à imitar essas ações, criaram projetos parecidos e aplicavam dentro das escolas. A palestra foi mais do que um resgate histórico da militância do negros, foi o análise da nossa realidade e  a adaptação dessas lições históricas no nossos cotidianos, pois em cada assunto que ela se aprofundava ela fazia referências ao que vivemos hoje (nos mostrando que ainda existe preconceito, que ainda temos muito o que conquistar).
All Power to the People, não é poder ao povo e sim poder à todos os povos... Sim, nós falamos com ela!

Representantes do movimento HIP HOP, militantes de movimentos sociais das periferias espalhadas por São Paulo, estudantes negros, todos puderam falar sobre suas experiências. As Mães de Maio e tantos outros movimentos foram lembrados durante as falas. E diante disso ficou claro, até da nossa parte que os Black Panther influenciou em muito nas nossas vidas. Cada palavra direcionada a Ericka era retornada à quem as pronunciava com muito carinho, e novamente as lágrimas eram inevitáveis.



“Minhas pernas tremiam (acho que meu corpo inteiro), era um tremor que vinha do coração. Minhas palavras? nem eu lembro direito, mas eu não podia perder aquela oportunidade de mostra a minha experiência como mulher, negra, periférica, jovem. Citei a militância em Cotia, agradeci à Ericka por me dar força pra continuar lutando, e disse que minha referência de luta era a Alma, também ex-militante do Partido e disse que a história do Partido em si me influenciava muito. Chorei um pouquinho – só um pouquinho ok! E sorri quando ela me disse que aquele sentimento era recíproco. Ela estava olhando pra mim, me escutando! Vocês tem noção do que é isso? No final da atividade fomos falar com ela, a abraçamos. (acho que foi isso, estava num misto de sentimentos, mas o destaque foi pro meu nervosismo, talvez depois eu me lembre de mais alguma coisa que a emoção deixou passar).” Irenita, militante da Juventude LibRe


            Depois de todas as falas, vimos as pessoas interagindo, como se aquele laço que a Ericka havia feio com suas palavras tivesse sido firmado com um nó bem apertado nas falas das outras pessoas.Muitas pessoas vieram nos abraçar, distribuíam sorrisos. Um militante do movimento HIP HOP, de quase dois metros de altura nos abordou dizendo “Ae parabéns, me emocionei de verdade com a fala dessa mina aí! Satisfação”.Essa atividade foi pra muitos a renovação dos votos como um militante de esquerda. Nos fez lembrar que a luta não é entre nós e sim contra o opressor, e que devemos lutar bravamente todo dia e que não devemos esquecer de lutar com o coração.





Você já viu nos livros de história falar sobre mulheres negras? Não, não existe! Procura na história dos negros nacional ou internacional e vocês vão ver homens. Através de pesquisas específicas encontramos mulheres, e sempre surge o nome "Black Panther". A Ericka, é especial. Ela é jovem, nas palavras, na forma como lida com as pessoas (ela é mais jovem que eu!). Sua militância se iniciou aos 15 anos de idade, mais um motivo pra nos identificarmos. Ela mostrou que a luta é justa, válida e possível. A humildade dela também é algo inspirador, em momento algum ela se colocou como uma pessoa superior, ela deixou bem claro que veio da periferia e se orgulha disso e praticamente nos intimou à escrevermos nossas próprias histórias através da luta popular. São tantas qualidades numa pessoa tão simples, tanta beleza, tanto sentimento, que acho que vou procurar no dicionário novas palavras pra descrever por quê a vemos como exemplo.

Fotos: Resisto OPM

domingo, 11 de agosto de 2013

De 2013 a 1968: Juventude LibRe embarca numa viagem no tempo

Uma viagem no tempo: contemplados pelo saber e munidos com esperança. Talvez essas duas orações confirmem o sentimento coletivo da Juventude LibRe (SP), no último sábado (10), durante as atividades em São Paulo.

Na noite de sexta-feira (9) foram poucas as horas de sono. A ansiedade pelo dia seguinte não nos deixou pregar os olhos. O destino seria o centro de São Paulo, onde, primeiramente, iria ocorrer um debate na Faculdade de Tecnologia de São Paulo (Fatec) sobre as manifestações de junho deste ano. Na sequência, partiríamos para o Memorial da Resistência, logo ali, ao lado. 

Chegando na Fatec, sentamos no fundão – típico lugar geográfico da periferia. Lá na frente, a mesa do debate, formada por cinco pessoas. De um lado, dois senhores – um sindicalista e um professor do IFSP. Do outro, três jovens – dois integrantes do Movimento Passe Livre (MPL) e outro representante do Movimento Hip Hop e da LibRe. Esse último, podemos chamar de ‘mano Wesllen’.





Ambos debatedores tentaram entender o que ocorreu em junho, durante os protestos contra o aumento das tarifas do transporte público em São Paulo. Coerência de um lado, impaciência do outro – aqui, no sentido inverso da apresentação dos que compuseram a mesa.

Ficou nítido o nervosismo e a incompreensão dos mais velhos. Um verdadeiro ‘choque de gerações’. Para uma plateia composta por jovens, eles, os mais velhos, não conseguiram dialogar. Os outros – MPL e mano Wesllen – mandaram bem, tirando, inclusive – sem protagonismo – aplausos calorosos do público.

Aqui, vale ressaltar, não estamos pretendendo qualificar o debate segundo a faixa etária dos companheiros. Pelo contrário. Todo respeito aos mais velhos. Pena que eles perderam a linha junto com o pipa e o carretel. Os jovens ‘cortaram e apararam’, sem cerol, os papagaios - no sentido literário da palavra - dos mais velhos. Sim, papagaios! Bons para falar, mas não encontraram horizonte para alçar seus voos explanatórios. Em suma, os mais velhos, com os velhos métodos, perderam o bonde da história, e agora querem pegar carona e irem, ainda, na janelinha do bonde. Porém, as pessoas estão cansadas do velho método. Elas exigem mudanças e participação! E isso ficou mais do que transparente nas manifestações de junho – algo que eles não perceberam, ou não quiseram perceber.



Outro detalhe que ocorreu – e de extrema importância – foi lembrado pela companheira Irenita, vulgo ‘menininha’ – segundo Wesllen . Menininha, ao se dirigir aos debatedores, indagou sobre a importância das mulheres na luta social e questionou o por quê não havia participação feminina na mesa. Após aplausos intensificados do público, a mesa, por unanimidade, reconheceu a falha. Depois da manifestação de menininha, algumas ‘feministas’ saíram do armário. Uma, inclusive, foi até a frente do palco para que a atenção fosse direcionada a ela. Menininha, pequena no tamanho e grande na coragem, observou a atitude da tal feminista e acrescentou categoricamente: “É importante combatermos o machismo de dentro para fora. Não adianta criticar as pessoas, quando nós (mesmo sem perceber), fazemos as mesmas coisas.”

Enfim, o debate se encerrou. Mano Wesllen e os integrantes do MPL saíram coroados, sem coroas. Foram sucintos e diretos em suas explanações. Sem rodeios. Sem curvas. Mano Wesllen se destacou como o sujeito periférico da cena! Periferia é foda, mano! Nois representa memo!


No Memorial

Partimos, então, conforme o combinado, para o Memorial da Resistência, na Luz. Fomos atrás do alimento do saber, de barriga vazia. Sim, estávamos sem comer, e o estômago começava a requisitar o cérebro e, esse, por sua vez, projetava dores na cabeça e baixa resistência no corpo físico. A indagação veio: vamos comer primeiro? A resposta foi de acordo com o horário: era 13h00, portanto, não! Tínhamos agendado a visita ao Memorial, às 13h30, por isso, não daria tempo de comer nem um pão de queijo. Partimos rumo ao nosso destino.

Bastou pisar no Memorial para que o nosso anfitrião chegasse logo em seguida. Trata-se de Alípio Freire, ex preso político que ‘morou’ no lugar onde iríamos visitar. O hoje chamado Memorial da Resistência, foi o antigo Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (DEOPS), local onde os militares levavam as pessoas que faziam oposição ao regime ditatorial para torturar, sangrar e, inclusive, matar. Alípio ficou lá por alguns meses. Viu cenas de horror, sentiu na pele o verdadeiro significado da tortura. Mas ele, por incrível que pareça, não quis se fazer de coitado. Não queria, como em alguns filmes que retratam o período, passar apenas as impressões do sofrimento daquela época. Alípio, de maneira bem humorada e didática, quis, simplesmente, que aflorássemos o nosso censo crítico, mostrando que, além das torturas, a estrutura política por de trás do regime era composta, inclusive, pela classe empresarial. Sem o patronato, segundo Alípio, o golpe nem teria acontecido. A ditadura, portanto, foi Civil-Militar, e não apenas militar, como muitos designam. “Patrão bom é patrão morto”, disse Alípio.




Visitamos as celas e os corredores do antigo DEOPS. Vimos as pichações nas paredes com os nomes de algumas pessoas que passaram por lá. Ouvimos os depoimentos de alguns presos políticos da época. Ficamos impressionados com tudo aquilo. Conhecíamos, ouvimos falar, mas nunca tivemos um contato tão próximo com a realidade daquele período como desta vez. A fome? Que fome? Com tudo isso – e muito mais – de aprendizado, havíamos esquecido de que estávamos com fome. Ou então, estávamos saciando a nossa fome com outro tipo de alimento: o saber. E foi com esse alimento que saímos do museu, após uma rodada de café, chá, refrigerante e todinho. Nada de comida.









Partimos para o parque, ali mesmo na região, com o objetivo de trocarmos as nossas impressões sobre as duas atividades que acabáramos de exercer. Em meio às folhagens secas, caídas neste inverno, que é um misto de outono e verão – e porque não, de primavera – sentamos em círculo. Cada um falou o que sentiu. Em cada frase pronunciada, um sentimento sincero. Dava para observar nos olhos de cada um. Foi Kawaii (fofo, em japonês, segundo a Irenita).

Partiu Cotia, então? Vambora! Mas se engana quem pensa que as atividades encerraram ali. E a fome? Passava das 18h e não tínhamos comido nada! Pois é, cada um comeu quando chegou em sua residência, afinal, a resistência também se integra neste contexto.

Em Cotia

Passava das 19h quando chegamos em Cotia. Outra atividade estava marcada para às 23h. Cacete! Essa juventude é maluca! Por que não foram descansar ao invés de se desgastarem mais? – perguntaria qualquer pessoa normal. A resposta é simples: somos anormais.


Querem saber como foi a última atividade? Participem então da Juventude LibRe! Ajude-nos na construção de um outro modelo de sociedade! Vamos romper as estruturas desiguais proporcionadas pelo capitalismo! Liberdade só vem através de uma Revolução! E Revolução só se concretiza se tivermos organização!

Viva a Juventude, a Liberdade e a Revolução! 

Os 23 dias que abalaram a FACED

Culpadas!

Esse é o veredicto da surpreendente ação protagonizada pelo Movimento Estudantil da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), encabeçada por perigosas estudantes do curso de Pedagogia da FACED (Faculdade de Educação). A acusação que repousa sobre elas? Formação de quadrilha. Sim! Uma perigosa quadrilha, munida de armamento pesado: cultura, diversão e arte.

Não está entendendo nada? Tá. Então vamos explicar.

1)      Antecedentes:

Toda universidade tem problemas com espaços estudantis. Isso não é, nem nunca foi novidade. A luta por espaços estudantis é pauta permanente do M.E., e sempre constitui uma bandeira politizadora, que traz consigo um importante debate sobre o caráter do ensino universitário.

Na FACED-UFRGS isso não foi diferente. O DAFE (Diretório Acadêmico de Pedagogia) nunca teve um espaço digno para comportar sua demanda por vivência e integração entre os estudantes. A entidade sempre foi alocada em salinhas pequenas, onde mal dava para as gestões do diretório se reunirem.

E enquanto isso, bem ao lado do saguão da faculdade (ali, bem debaixo do nariz de todo mundo), um espaço que outrora havia sido cedido para uma lanchonete [falida e endividada] servia como depósito de materiais descartados. Diante desse descaso, o DAFE resolveu agir. E não foi pra menos: primeiro fez um abaixo-assinado pela cessão do espaço ao diretório, recolheu apoio de professores, se manifestou publicamente. E a diretoria da FACED? Fez que não era com ela.

Perante o silêncio e a inércia da burocracia universitária, só restou uma opção às estudantes da Pedagogia: ocupar aquilo que, no fundo, sempre foi delas.

2)      A quadrilha

No dia 10/07, no ritmo de festa junina, ao sabor de salgadinhos, refrigerantes e leitinhos, vestido de camisa xadrez e chapéu de palha, o vandalismo tomou conta da FACED. Segue o vídeo de como foram os primeiros minutos de ocupação do espaço: http://youtu.be/gxGlrlpHAUo

Pois é. Quem disse que o M.E. precisa ser sisudo e careta? A quadrilha impôs à ocupação o clima que ela teria nos próximos 23 dias: cultura, diversão e arte. Porque é assim que deve ser um espaço de vivência construído por estudantes: plural e democrático. Nesse tempo todo, o DAFE tomou o cuidado de aliar pluralidade com organização impecável, de forma a tornar o espaço habitável e construído coletivamente não só pela estudantada da FACED, mas também por outras entidades estudantis da UFRGS.



Ressalte-se a importante atuação de militantes do DCE (Diretório Central dos Estudantes) e da APG (Associação de Pós-Graduandos) que não arredaram pé da luta, sempre ao lado da galera da Pedagogia. Outros CA's e DA's também deram total apoio ao movimento, como o DAECA (DA de Economia), o CHIST (CA de História),o CECS (CA de C.Sociais), o DAQ (DA de Química), dentre outros. Essas entidades, junto do DAFE, foram responsáveis por fomentar incansáveis debates políticos nas assembleias e nos fóruns da ocupação, tornando o espaço um verdadeiro laboratório de Movimento Estudantil.

Entre um debate e outro, atividades das mais diversas possíveis. De oficinas de dança, a oficinas de cerâmica. Do ping-pong, à visita de professores de outros países e estudantes de outras universidades e outros estados. Dos almoços coletivos em conjunto com os funcionários terceirizados da universidade e com a ASSUFRGS (sindicato dos servidores da UFRGS), à visita do cartunista Latuff – que deixou seu apoio irrestrito ao movimento. Ao invés de ficar listando o que rolou em 23 dias de mobilização, é mais fácil perguntar o que não rolou...


Latuff dando um salve de apoio ao movimento

Charge do Latuff

Bixetes do 2º semestre sendo recebidas no espaço

Funcionários terceirizados da universidade jogando um ping-pong na frente da ocupação

Debate do Grupo de Estudos feministas das estudantes da Letras da UFRGS

Apresentação musical na ocupação


3)      O desfecho: VITÓRIA

Na última quinta-feira (01/08), a galera deu início à desocupação do espaço. O movimento  conquistou uma importante vitória parcial e celebrou junto à direção da FACED um acordo que concede o empréstimo do espaço ao DAFE pelo período 90 dias. De fato, a oficialização ainda precisa ser deliberada pelo Consuni (Conselho da Universidade). Entretanto, caso o Conselho não delibere a cessão definitiva, o empréstimo poderá ser renovado pela FACED. O acordo foi firmado em ato realizado na própria ocupação, e recebeu a tão aguardada assinatura da diretora Simone Valdete dos Santos, que acabou por reconhecer a vitória do movimento.

Ato público para assinatura conjunta do termo de empréstimo do espaço em 01/08

Gurias do DAFE celebrando termo junto à diretora da FACED, Simone Valdete dos Santos

E, bem... Como o movimento terminou? Assim como começou: em ritmo de festa junina. A luta ainda vai continuar. Nos próximos meses o DAFE tem o desafio de manter o espaço em pé, habitado e com atividades políticas e culturais.

Segue a carta final, elaborada pelos ocupantes:

Apenas começamos...

“Do rio que tudo arrasta se diz violento, porém ninguém diz violentas as margens que o comprimem.” Bertolt Brecht

Na manhã do dia 10 de julho de 2013 iniciou-se a ocupação do espaço anteriormente locado ao Café FACED. Vinte e três dias se passaram desde a festa junina que marcou a entrada em “quadrilha” na sala que, naquele momento, servia de depósito para materiais já sem uso.
De lá para cá fizemos desse espaço ocioso um lugar vivo: repleto de formação, cultura, diversão e arte. As portas que se abriram trouxeram ventos que varreram a poeira do conservadorismo, muros foram derrubados, o marasmo deu lugar à alegria. É esse o sentido pedagógico da ação de ocupação, tantas vezes mal compreendida ou caluniada.

Hoje assinamos publicamente o acordo entre o Diretório Acadêmico da Faculdade de Educação (DAFE) e a Direção da FACED que permite a desocupação deste espaço. Chegar até ele não foi fácil, uma vez que ele ainda não contempla o objetivo principal do movimento estudantil da UFRGS: a cessão definitiva do espaço ao DAFE, que tem o compromisso de abrigar na sua sede um espaço livre para atividades de formação e todas as formas de manifestação artístico-culturais da comunidade. Este acordo foi a mediação possível no atual momento, para que o diálogo ganhe novo fôlego e a democracia frágil de até então ganhe nova chance de prosperar.

Utilizaremos o empréstimo formalizado hoje como o laboratório da práxis, que provará na prática a capacidade de organização dos estudantes; que mostrará a todos como funciona um espaço verdadeiramente aberto; que realizará no presente aquilo que queremos para o futuro. Essa é a vitória parcial que hoje conquistamos.

Entretanto, sabemos que a verdadeira vitória somente se dará com a cessão definitiva do espaço ao DAFE. Nossa campanha por essa formalização seguirá e apresentaremos nossa proposta e intenções para todas as pessoas e em todos os lugares. Mais do que isso, exigimos e seguimos demandando uma ampliação cada vez maior do debate público. Dele não nos furtaremos e não o tememos.
Cumpridos.

Estaremos vigilantes para que os compromissos assumidos sejam plenamente.

Lutar também é educar! ‪#‎OcupaFACED

“[...] todo amanhã se cria num ontem, através de um hoje [...]. Temos de saber o que fomos para saber o que seremos.” Paulo Freire

Gurizada finalizando o período de ocupação em ritmo de festa junina