terça-feira, 29 de dezembro de 2009

O DIREITO DA HUMANIDADE A EXISTIR

A mudança climática já causa danos consideráveis e centenas de milhões de pobres sofrem as conseqüências.

Os centros de investigações mais avançados garantem que resta muito pouco tempo para evitar uma catástrofe irreversível. James Hansen, do Instituto Goddard da NASA, assevera que um nível de 350 partes do dióxido de carbono por milhão ainda é tolerável; contudo, hoje ultrapassa a cifra de 390 e cada ano se incrementa a ritmo de duas partes por milhão, ultrapassando os níveis de há 600 mil anos. As últimas duas décadas têm sido, cada uma delas, as mais calorosas desde que se têm notícias do registro. Nos últimos 150 anos o mencionado gás aumentou 80 partes por milhão.

O gelo do Mar Ártico, a enorme camada de dois quilômetros de espessura que cobre a Groenlândia, as geleiras da América do Sul que nutrem suas fontes principais de água doce, o volume colossal que cobre a Antártida, a camada que resta do Kilimanjaro, os gelos que cobrem a Cordilheira do Himalaia e a enorme massa gelada da Sibéria estão a se derreter visivelmente. Cientistas notáveis temem saltos quantitativos nestes fenômenos naturais que originam a mudança.

A humanidade pôs grandes esperanças na Cimeira de Copenhague, depois do Protocolo de Kyoto subscrito em 1997, que começou a vigorar no ano 2005. O estrondoso fracasso da Cimeira deu lugar a vergonhosos episódios que precisam ser esclarecidos.

Os Estados Unidos da América, com menos de 5% da população mundial emitem 25% do dióxido de carbono. O novo Presidente dos Estados Unidos da América prometeu cooperar com o esforço internacional para encarar um problema que afeta esse país e o resto do mundo. Durante as reuniões prévias à Cimeira, ficou evidenciado que os dirigentes dessa nação e dos países mais ricos manobravam para fazer com que o peso do sacrifício caísse sobre os países emergentes e pobres.

Grande número de líderes e milhares de representantes dos movimentos sociais e instituições científicas decididos a lutar por preservar a humanidade do maior risco de sua história, viajaram a Copenhague convidados pelos organizadores da Cimeira. Não vou me referir aos detalhes sobre a brutalidade da força pública dinamarquesa, que arremeteu contra milhares de manifestantes e convidados dos movimentos sociais e científicos que acudiram à capital da Dinamarca, para me concentrar nos aspectos políticos da Cimeira.

Em Copenhague reinou um verdadeiro caos e aconteceram coisas incríveis. Os movimentos sociais e instituições científicas foram proibidos de participar nos debates. Houve Chefes de Estado e de Governo que não puderam nem sequer emitir suas opiniões sobre problemas vitais. Obama e os líderes dos países mais ricos apropriaram-se da conferência com a cumplicidade do governo dinamarquês. Os organismos das Nações Unidas foram relegados.

Barack Obama, que chegou no último dia da Cimeira para permanecer ali apenas 12 horas, reuniu-se com dois grupos de convidados escolhidos "a dedo" por ele e seus colaboradores. Junto a um deles se reuniu na sala da plenária com o resto das mais altas delegações. Falou e foi embora logo pela porta traseira. Nessa sala, com a exceção do grupo selecionado por ele, foi proibido fazer uso da palavra aos outros representantes dos estados. Nessa reunião os Presidentes da Bolívia e da República Bolivariana da Venezuela puderam falar porque, perante o reclamo dos representantes o Presidente da Cimeira não teve outra alternativa que lhes conceder a palavra.

Noutra sala contígua, Obama reuniu os líderes dos países mais ricos, vários dos Estados emergentes mais importantes e dois muito pobres. Apresentou um documento, negociou com dois ou três dos países mais importantes, ignorou a Assembléia Geral das Nações Unidas, ofereceu entrevistas coletivas, e foi embora como Júlio César numa de suas campanhas vitoriosas na Ásia Menor, que fez com que exclamasse: Cheguei, vi e venci.

O próprio Gordon Brown, Primeiro Ministro do Reino Unido, no dia 19 de outubro, afirmou: "Se não chegamos a um acordo, no decurso dos próximos meses, não devemos ter nenhuma duvida de que, uma vez que o crescimento não controlado das emissões tenha provocado danos, nenhum acordo global retrospectivo, nalgum momento do futuro, poderá desfazer tais efeitos. Nessa altura, será irremediavelmente tarde demais."

Brown concluiu seu discurso com dramáticas palavras: "Não podemos dar-nos ao luxo de fracassar. Se fracassamos agora, pagaremos um preço muito alto. Se atuamos agora, se atuamos de conjunto, se atuamos com visão e determinação, o sucesso em Copenhague ainda estará ao nosso alcance. Mas se fracassamos, o planeta Terra estará em perigo, e para o planeta não existe um Plano B."

Agora, declarou com arrogância que a Organização das Nações Unidas não deve ser tomada como refém por um pequeno grupo de países como Cuba, a Venezuela, a Bolívia, a Nicarágua e Tuvalu, ao mesmo tempo que acusa a China, a Índia, o Brasil, a África do Sul e outros Estados emergentes de cederem perante as seduções dos Estados Unidos da América para subscreverem um documento que lança à lixeira o Protocolo de Kyoto e não contém nenhum compromisso vinculativo por parte dos Estados Unidos da América e dos seus aliados ricos.

Sou obrigado a recordar que a Organização das Nações Unidas nasceu há apenas seis décadas, depois da última Guerra Mundial. Os países independentes, naquela altura não ultrapassavam o número de 50. Hoje fazem parte dela mais de 190 Estados independentes, após ter deixado de existir, produto da luta decidida dos povos, o odioso sistema colonial. À própria República Popular China, durante muitos anos, lhe foi negado pertencer à ONU, e um governo fantoche ostentava sua representação nessa instituição e em seu privilegiado Conselho de Segurança.

O apoio tenaz do crescente número de países do Terceiro Mundo foi indispensável no reconhecimento internacional da China, e um fator de suma importância para que os Estados Unidos da América e seus aliados da NATO lhe reconheceram seus direitos na Organização das Nações Unidas.

Na heróica luta contra o fascismo, a União Soviética tinha realizado o maior contributo. Mais de 25 milhões de seus filhos morreram, e uma enorme destruição assolou o país. Dessa luta emergiu como superpotência capaz de contrapesar em parte o domínio absoluto do sistema imperial dos Estados Unidos da América e as antigas potências coloniais para o saqueio ilimitado dos povos do Terceiro Mundo. Quando a URSS se desintegrou, os Estados Unidos da América estenderam o seu poder político e militar para o Leste, até o coração da Rússia, e a sua influência sobre o resto da Europa aumentou. Nada de estranho tem o acontecido em Copenhague.

Desejo sublinhar o injusto e ultrajante das declarações do Primeiro Ministro do Reino Unido e a tentativa ianque de impor, como Acordo da Cimeira, um documento que em nenhum momento foi discutido com os países participantes.

O Ministro das Relações Exteriores de Cuba, Bruno Rodríguez, na entrevista coletiva oferecida no dia 21 de dezembro, afiançou uma verdade que é impossível negar; usarei textualmente alguns dos seus parágrafos: "Gostaria de enfatizar que em Copenhague não houve nenhum acordo da Conferência das Partes, não foi tomada nenhuma decisão com respeito aos compromissos vinculativos ou não vinculativos, ou de natureza de Direito Internacional, de maneira nenhuma; simplesmente, em Copenhague não houve acordo".

"A Cimeira foi um fracasso e um engano à opinião pública mundial. [...] ficou a descoberto a falta de vontade política..."

"... foi um passo atrás na ação da comunidade internacional para prever o mitigar os efeitos da mudança climática..."

"... a média da temperatura mundial poderia aumentar em 5 graus..."

Logo, o nosso Ministro das Relações Exteriores acrescenta outros dados de interesse sobre as possíveis conseqüências segundo as últimas pesquisas da ciência.

"...desde o Protocolo de Kyoto até a data as emissões dos países desenvolvidos aumentaram 12,8%... e desse volume 55% corresponde aos Estados Unidos da América."

"Um estadunidense consome anualmente, em média, 25 barris de petróleo, um europeu 11, um cidadão chinês menos de dois, e um latino-americano ou caribenho, menos de um."

"Trinta países, incluídos os da União Européia, consomem 80% do combustível produzido."

O fato muito real é que os países desenvolvidos que subscreveram o Protocolo de Kyoto aumentaram drasticamente suas emissões. Querem substituir agora a base adotada das emissões a partir de 1990 com a de 2005, com o qual os Estados Unidos da América, o máximo emissor, reduziria só 30% suas emissões de 25 anos antes. É uma desavergonhada zombaria à opinião pública.

O Ministro das Relações Exteriores cubano, falando em nome de um grupo de países da ALBA, defendeu a China, a Índia, o Brasil, a África do Sul e outros importantes Estados de economia emergente, afirmando o conceito alcançado em Kyoto de "responsabilidades comuns, porém diferenciadas, quer dizer que os acumuladores históricos e os países desenvolvidos, que são os responsáveis por esta catástrofe, têm responsabilidades diferentes às dos pequenos Estados insulares ou às dos países do Sul, sobretudo os países menos desenvolvidos..."

"Responsabilidades quer dizer financiamento, responsabilidades quer dizer transferência de tecnologia em condições aceitáveis, e então Obama faz um jogo de palavras, e em vez de falar de responsabilidades comuns, porém diferenciadas, fala de ‘respostas comuns, porém diferenciadas’."

"... abandonou a sala sem se dignar a escutar ninguém, nem tinha escutado ninguém antes de sua intervenção."

Numa entrevista coletiva posterior, antes de abandonar a capital dinamarquesa, Obama afirma: "Temos produzido um substancial acordo sem precedente aqui em Copenhague. Pela primeira vez na história, as maiores economias viemos juntas aceitar responsabilidades."

Em sua clara e irrefutável exposição, nosso Ministro das Relações Exteriores afirma: Que quer dizer isso de que ‘as maiores economias viemos juntas aceitar nossas responsabilidades’? Quer dizer que estão descarregando um importante peso da carga que significa o financiamento para a mitigação e a adaptação dos países sobre todo do Sul à mudança climática, sobre a China, o Brasil, a Índia e a África do Sul; porque há que dizer que em Copenhague teve lugar um assalto, um roubo contra a China, o Brasil, a Índia, a África do Sul e contra todos os países chamados com eufemismo em desenvolvimento."

Estas foram as palavras contundentes e incontestáveis com as quais nosso ministro das Relações Exteriores relata o acontecido em Copenhague.

Devo acrescentar que, quando às 10 horas do dia 19 de dezembro nosso vice-presidente Esteban Lazo e o Ministro das Relações Exteriores cubano tinham ido embora, se produziu uma tentativa tardia de ressuscitar o morto de Copenhague, como um acordo da Cimeira. Nesse momento, não restava praticamente nenhum Chefe de Estado nem apenas ministros. Novamente, a denúncia dos restantes membros das delegações de Cuba, da Venezuela, da Bolívia, da Nicarágua e de outros países derrotou a manobra. Foi assim que finalizou a inglória Cimeira.

Outro fato que não pode ser esquecido foi que nos momentos mais críticos desse dia, em horas da madrugada, o ministro das Relações Exteriores de Cuba, juntamente com as delegações que travavam uma digna batalha, ofereceram ao secretario-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, sua cooperação na luta cada vez mais dura que se levava a acabo, e nos esforços a se realizarem no futuro para preservar a vida de nossa espécie.

O grupo ecológico Fundo Mundial para a Natureza (WWF) advertiu que a mudança climática ficaria fora de controle nos próximos 5 a 10 anos, se não são diminuídas drasticamente as emissões.

Mas não faz falta demonstrar o essencial do que aqui é afirmado a respeito do feito por Obama.

O presidente dos Estados Unidos da América declarou, quarta-feira, 23 de dezembro, que as pessoas têm razão ao estarem decepcionados pelo resultado da Cimeira sobre a Mudança Climática. Em entrevista pela cadeia de televisão CBS, o mandatário assinalou que "’em vez de ver um total colapso, sem que tivesse feito nada, o que poderia ter sido um enorme retrocesso, ao menos nos mantivemos mais ou menos donde estávamos’..."

Obama — afirma a notícia — é o mais criticado por aqueles que, de maneira quase unânime, sentem que o resultado da Cimeira foi desastroso.

A ONU agora está numa situação difícil. Pedir a outros países que adiram ao arrogante e antidemocrático acordo seria humilhante para muitos Estados.

Continuar a batalha e exigir em todas as reuniões, principalmente nas de Bonn e do México, o direito da humanidade a existir, com a moral e a força que nos outorga a verdade, é segundo a nossa opinião o único caminho.




Reflexões do companheiro Fidel - Extraído de Cubadebate

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Unicef confirma que Cuba tem 0% de desnutrição infantil

A existência no mundo em desenvolvimento de 146 milhões de crianças menores de cinco anos abaixo do peso, contrasta com a realidade das crianças cubanas, reconhecidas mundialmente por estarem alheias a este mal social.

Essas preocupantes cifras apareceram em um recente reporte do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), sob o título de "Progresso para a Infância, um balanço sobre a nutrição", divulgado na sede da ONU.

De acordo com o documento, as porcentagens de crianças abaixo do peso são de 28% na África Subsaariana, 17% no Oriente Médio e África do Norte, 15% na Ásia Oriental e no Pacífico, e 7% na América Latina e no Caribe. A lista fica completa com a Europa Central e do Leste, com 5%, e outros países em desenvolvimento, com 27%.

Cuba não tem esses problemas. É o único país da América Latina e do Caribe que eliminou a desnutrição infantil severa, graças aos esforços do Governo para melhorar a alimentação da população, especialmente daqueles grupos mais vulneráveis.

As cruas realidades do mundo mostram que 852 milhões de pessoas padecem de fome e que 53 milhões delas vivem na América Latina. Apenas no México existem 5 milhões e 200 mil pessoas desnutridas e no Haiti três milhões e 800 mil, enquanto que em todo o planeta morrem de fome a cada ano mais de cinco milhões de crianças.

De acordo com estimativas das Nações Unidas, não seria muito custoso oferecer saúde e nutrição básica para todos os habitantes do Terceiro Mundo. Bastaria, para alcançar essa meta, 13 bilhões de dólares anuais adicionais ao que agora se destina, uma cifra que nunca se conseguiu e que é exígua se se compara com o bilhão que a cada ano se destina à publicidade comercial, aos 400 bilhões em drogas entorpecentes ou inclusive aos 8 bilhões que se gasta com cosméticos nos Estados Unidos.

Para satisfação de Cuba, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) também reconheceu que esta é a nação com mais avanços na América Latina na luta contra a desnutrição.

O Estado cubano garante uma cesta básica alimentícia que permite a nutrição de sua população ao menos nos níveis básicos- mediante a rede de distribuição de produtos básicos.

De igual forma, são feitos reajustes econômicos em outros mercados e serviços locais para melhorar a alimentação do povo cubano e atenuar o déficit alimentar. Especialmente mantém-se uma constante vigilância sobre o sustento dos meninos, meninas e adolescentes. Assim, a atenção à nutrição começa com a promoção de uma melhor e natural forma de alimentação da espécie humana. O tema desnutrição cobra grande importância na campanha da ONU para conseguir em 2015 as Metas de Desenvolvimento do Milênio, adotadas na Cúpula de chefes de Estado e de Governo celebrada em 2000, e que têm entre seus objetivos eliminar a pobreza extrema e a fome para essa data.

Não isenta de deficiências, dificuldades e sérias limitações por um bloqueio econômico, comercial e financeiro imposto pelos Estados Unidos há mais de quatro décadas, Cuba não mostra desesperadores nem alarmantes índices de desnutrição infantil. Nenhuma das 146 milhões de crianças menores de cinco anos abaixo do peso que vivem hoje no mundo são cubanas.


A notícia é de Imprensa Latina, com informações da Adital.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Uma CPMI contra a Reforma Agrária

João Pedro Stedile*
A burguesia agrária brasileira não tem jeito mesmo. O seu poder econômico, político e ideológico na mídia brasileira é tão grande que a deixa cada vez mais prepotente; porém, cega e burra.
Vejamos alguns dados da realidade agrária explicitados pelo censo agropecuário realizado pelo IBGE em dezembro de 2006 e recentemente publicados:

- Cerca de um por cento dos proprietários de terra no Brasil, controlam 46% de todas as terras do país.

- Apenas 15 mil fazendeiros, que possuem áreas acima de 2.500 ha, são donos de 98 milhões de hectares (equivalente a 4 Estados de São Paulo juntos).

- A concentração de terras no Brasil continua aumentando. E se desnacionalizando. Nos últimos anos as empresas transnacionais compraram mais de 20 milhões de hectares. E junto com a terra, água, minérios, etanol, usinas, madeira e biodiversidade.


- O Índice de Gini que mede a concentração de terras, no Brasil é de 0,856 e é o segundo país de maior concentração de terras do mundo.

- O Banco Oportunity, por exemplo, que opera recursos de origem norte-americana comprou em apenas três anos, 56 fazendas e mais de 600 mil ha, no sul do Pará.

- A empresa Cutrale, passou a monopolizar a produção de sucos de laranja e conseguiu levar a miséria milhares de pequenos e médios agricultores paulistas que tiveram que destruir nada menos do que 280 mil ha de cultivo de laranjas, nos últimos dez anos. Mas ela acumulou 60 mil ha, em 36 fazendas. Detém 80% de toda produção de suco do país, exporta 90% e controla 30% do comércio mundial de suco, em parceria com a coca-cola.

- Os fazendeiros vinculados ao agronegócio produzem ao redor de 100 bilhões de reais por ano. Mas estão cada vez mais dependentes do capital financeiro e para conseguir produzir esse valor tomam emprestado junto aos bancos, todos os anos, ao redor de 90 bilhões de reais de crédito rural.

- Essa produção é na verdade fruto do trabalho de aproximadamente três milhões de assalariados permanentes e temporários. É revendida para apenas 20 empresas (a maioria transnacionais) que controlam o comercio de commodities e de insumos agrícolas no Brasil.

- O Balanço dessas 20 maiores empresas que atuam no agro revelou que elas faturam sozinhas ao redor de 115 bilhões de reais por ano. Ou seja, toda aquela riqueza vai parar nas mãos deles.

- O agronegócio dá emprego para apenas 15% da população economicamente ativa (PEA) os outros 85% trabalham na agricultura familiar. Ou seja, há 18 milhões de trabalhadores rurais adultos, e destes 15 milhões estão na agricultura familiar.

- Do total de trabalhadores adultos que estão na agricultura, 80% fez apenas ate a quarta serie do ensino fundamental, e há 35% de analfabetos.

- A agricultura familiar produz 85% de todos alimentos que vão para a mesa do povo brasileiro. Já o agronegócio produz apenas commodities, ou seja, matérias primas para exportação.

-Cerca de 90% dos proprietários de terra que detêm áreas acima de 200 hectares não moram nas fazendas, mas nas cidades. Dos 15 mil maiores fazendeiros, a grande maioria mora em São Paulo e no Rio de Janeiro.

- Graças a essa aliança entre os grandes fazendeiros brasileiros com as empresas transnacionais, o Brasil se transformou em 2008, o maior consumidor mundial de venenos agrícolas. São aplicados nos 45 milhões de hectares, nada menos que 700 milhões de litros de venenos. Apenas seis empresas produzem: Monsanto, Syngenta, Bayer, Basf, Shell, todas transnacionais. Os agrotóxicos são de origem química. Matam o solo, matam a biodiversidade, contaminam as águas e viram câncer no seu estomago.

- O Brasil é a nona economia mundial em produção de riquezas. Mas está em 75º lugar nas condições de vida da população, e é a sétima pior sociedade do mundo, em desigualdade social.

- Desde a redemocratização, em 1985, mais de 1.600 lideranças de trabalhadores foram assassinadas no campo. Destes apenas 80 chegaram aos tribunais, 15 foram condenados e uns 5 mandantes e assassinos estão na cadeia. Todos os demais estão impunes inclusive os autores dos massacres de Corumbiara (1995) Carajás (1996) e Felisburgo (2004).

O que fazer para enfrentar uma realidade tão dura e injusta? Os parlamentares ruralistas que são a fina flor da direita atrasada e burra decidiram: Vamos convocar uma CPMI, para impedir a reforma agrária!!

Como diria o saudoso Florestan Fernandes, como nos faz falta uma revolução burguesa! Pelo menos.

*Membro da coordenação nacional do MST e da Via campesina Brasil

Publicado em Adital

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Democratização da mídia e da educação

Confecom

A forte concentração dos meios de comunicação de massa representa um obstáculo para que o país se reconheça enquanto nação plural, comprometendo a diversidade informativa e cultural. Ante tal cenário, é relevante uma ampla discussão, com a participação de todas as visões presentes na sociedade, sobre o papel do Estado como esfera de regulação e fomento do sistema comunicacional. Isso porque cabe ao ente estatal definir políticas públicas de comunicação, educação e tecnologia, assim combatendo ações homogeneizantes e auxiliando na construção de processos midiáticos que permitam ao Brasil compreender-se em sua totalidade e desenvolver-se enquanto país de muitos rostos e vozes.

Nesse sentido, a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) é um importante espaço de reflexão sobre as políticas de regulação da mídia, sobretudo das operações sob concessão pública (rádio e televisão abertos). Entre outros propósitos, a Conferência deve trazer à tona diferentes pontos de vista, revelando ser indispensável definir responsabilidades com a informação pública de qualidade, assim como o caráter educativo que nela deve estar presente, construindo uma agenda não-mercadológica a ser seguida pelos veículos.

A relevância da discussão desde o ângulo educacional pauta-se na constatação do grande público das indústrias culturais, em especial da TV, e da inegável força da mídia como produtora de sentidos e significados, com repercussão generalizada. Portanto, há uma dimensão socializadora nas ações da mídia que não pode ser menosprezada, visto que ela legitima valores e estimula comportamentos, através de seus programas, imagens e mensagens, ocasionando uma reconfiguração sócio-cultural, da qual faz parte.

Interatividade e Canal da Educação

A partir deste aspecto, é primordial, frente às mudanças provocadas pela digitalização, refletir como estão sendo desenvolvidas as políticas públicas e como devem ser definidos novos marcos regulatórios, para superar a concentração oligopólica e estimular os meios a cooperarem na promoção de melhorias do processo educacional, minimizando as desigualdades sociais. O Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD) tem papel a cumprir na inclusão social dos cidadãos, na democratização da radiodifusão e na criação de uma rede universal de educação à distância, metas previstas no Decreto Presidencial 4901.

Tais objetivos consideram a relevante presença dos elementos midiático-tecnológicos na sociedade, que vêm transformando o modo dos indivíduos comunicarem-se, relacionarem-se e construírem conhecimentos, movimento potencializado com a digitalização. A escola, como espaço formal de educação, não pode ficar alheia a essas mudanças, sendo relevante refletir sobre a integração dos meios de comunicação no espaço de ensino e aprendizagem, em sua dimensão de ferramenta pedagógica para promover uma educação para e pela mídia. Pensar a responsabilidade social midiática exige uma reflexão sobre a importância de políticas públicas que também contemplem a educação nas áreas comunicacionais, valorizando a formação dos cidadãos e evitando que os meios funcionem basicamente como mecanismos favorecedores da dinâmica de acumulação de capital, beneficiando uma minoria.

A discussão sobre a TV digital merece atenção especial, dadas as perspectivas que se abrem ao campo educacional. No sentido de promover a educação diante das inovações tecnológicas, duas são as expectativas voltadas para a operação da televisão digital: a possibilidade da interatividade, citada no artigo 6 do Decreto 5.820, que implantou o Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre (SBTVD-T); e a abertura do Canal da Educação, mencionado no artigo 13 do referido diploma legal, atualmente em fase de planejamento, sob a coordenação do Ministério da Educação (MEC).

Compreensão, tecnologia e capacitação

A interatividade, uma característica dos novos meios digitais, vai ao encontro da necessidade de inovações nas práticas pedagógicas. A capacidade de interação entre o telespectador e a emissora e a convergência com outros aparelhos abrem ainda mais o leque de opções aplicativas de uso e propiciam o vislumbre preliminar de quais seriam os recursos que poderiam ser explorados nos processos de ensino-aprendizagem, na apropriação dos elementos de linguagem e nas alternativas técnicas para produção e transmissão do conhecimento.

Pensar um canal educativo público aberto, com lógicas não-comerciais, portanto, comprometido com a variedade cultural do país, a produção audiovisual nacional e um jornalismo plural, tem uma função importante na construção educacional da sociedade brasileira. Diante do exposto, aprofundar a discussão sobre a democratização da comunicação na Confecom é simultaneamente falar de cultura humana, economia, política, educação e desenvolvimento tecnológico, dentre outros temas que permeiam os espaços midiáticos. É ainda uma tentativa de assegurar bases democráticas para as mídias eletrônicas, na busca de atualização da legislação, defasada no passar de décadas.

Concluindo, é importante ressaltar que educar através das novas mídias exige que educadores e comunicadores abracem alguns objetivos comuns: a compreensão intelectual dos meios, o domínio da tecnologia e a capacitação para sua utilização livre e criativa. O caminho de promover uma educação pela mídia significa tanto comprometer emissoras a ofertar mais e melhores programas ao público, quanto lutar por mais canais educativos no sistema aberto de televisão.



sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Documento revela violações de direitos humanos no Brasil

O capitalismo é agressivo e violento, principalmente para os trabalhadores do campo. Esta é a avaliação da integrante da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, Maria Luiza Mendonça, após o lançamento do Relatório Direitos Humanos no Brasil 2009. O documento está em sua 10ª edição e foi divulgado nesta quarta-feira (09). O estudo apresenta como os direitos humanos no Brasil foram violados em diversos setores da sociedade nos últimos dez anos.

Em relação aos conflitos decorrentes da luta pela terra, por exemplo, só no ano de 2008, 28 trabalhadores foram assassinados. O número de conflitos agrários no ano foi de 1.170.

Maria Luiza relatou que este ano, a atual crise econômica mundial é um fator novo que fez com que o capitalismo se apropriasse mais dos recursos naturais, fato que prejudica as populações que vivem próximas aos locais que contém grandes recursos, como a Amazônia.

“A crise fez com que o capitalismo, para se reciclar, avançasse de forma mais violenta sobre recursos estratégicos. Tanto os tradicionais, como os chamados alternativos – terra, água e biodiversidade. E essas comunidades que lutam pelos seus direitos, e que estão nesses territórios, têm um desafio maior, e isso faz mudar a luta e a resistência dos movimentos sociais. Esse é um fator novo e preocupante.”

O documento também registrou o aumento do trabalho escravo. Somente no primeiro semestre deste ano, mais de duas mil pessoas foram libertas de condições análogas à escravidão.

Problemas de acesso à água, desigualdade educacional, péssimas condições dos presídios brasileiros, dificuldades enfrentadas pelos quilombolas e situação dos migrantes também foram abordados pelo documento.

De São Paulo, da Radioagência NP

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Bolívia Festeja: Evo Morales rompe a ‘media luna’, ganha em sete dos nove Departamentos


A quarta vitória eleitoral consecutiva de Evo Morales, agora com um preliminar 62,2% da votação nacional, consigna a ampliação de sua supremacia política pelo Movimento Al Socialismo (MAS) em regiões da chamada "Meia Lua" onde a oposição manteve durante quatro anos um poder impenetrável.

Segundo a projeção de resultados na boca de urna emitidos pela rede de TV ATB, o oficialismo conseguiu vitória em Tarija, com 47,3% dos votos, seguido pelo Plan Progreso para Bolivia (PPB-Convergencia) com 32,2%. Há empate técnico em Santa Cruz (MAS, com 43,5% e PPB com 43,2%) e em Pando (PPB, com 48,5% e MAS com 47%).

A supremacia da oposição, circunstancialmente dominada pelo PPB se mantém em Beni, onde a força de Manfred Reyes Villa alcançou 48,1% contra 36% do MAS. Em La Paz, em Oruro, em Potosí, em Cochabamba e em Chuquisaca a votação é amplamente favorável a Linera e Evo Morales.

O oficialismo não pode alcançar resultados favoráveis nos Departamentos de Santa Cruz, Beni, Pando e Tarija, onde, em 2005 não conseguiu instituir seus prefeitos, apesar da histórica vitória presidencial com 53,7% de votos em todo o país. Nem no referendo revocatório de 10 de agosto de 2008, o MAS conseguiu seu propósito, apesar de que conseguiu destituir seus opositores de seus mandatos: Manfred Reyes Villa, em Cochabamba, e José Luis Paredes, em La Paz.

Na consulta constituinte de 25 de janeiro de 2009 o oficialismo conseguiu 61,4% de respaldo à nova Constituição Política do Estado (CPE), que tampouco afetou a região opositora, levemente prejudicada pela suspensão no cargo de Leopoldo Fernández, em Pando, detido preventivamente na penitenciária de San Pedro, acusado por sua suposta vinculação no massacre de El Porvenir, em setembro de 2008.

Agora que conta com uma extra-oficial maioria em Tarija e uma primeira posição em Santa Cruz e Pando, conseguida a duras penas, Morales e o MAS rompem também com os 27 anos de história da recuperação da democracia no país. Por quarta vez consecutiva em menos de quatro anos ganham as eleições nacionais na Bolívia, desta vez para garantir um segundo mandato por cinco anos mais a partir do dia 22 de janeiro de 2010.

Em uma votação histórica, que também definiu a eleição de 166 membros da Assembleia Legislativa Plurinacional, a passagem ou não de 12 municípios para as autonomias indígenas originárias, a passagem de quatro Departamentos (Potosí, Oruro, La Paz e Cochabamba) e a região do Chaco para um regime autonômico, o mandatário conseguiu 63,2% dos votos, segundo os resultados de boca de urna oferecidos pela televisão nacional. Em seguida, Reyes Villa, com 24,1% e Samuel Doria Medina, da Unidade Nacional (UM), com 7,7%. Cauteloso na manhã e, à tarde, seguro de uma votação favorável, Evo Morales, seu gabinete de ministros e representantes de organizações sociais esperaram os resultados no Palácio de Governo, aonde, após uma estadia no Chapare, onde votou, e em Cochabamba. Antes de seu retorno a La Paz, o mandatário expressou estar ‘seguríssimo’ de ganhar nos nove Departamentos.

Líder cocaleiro, natural de Orinoca (Oruro) e aliado do presidente venezuelano Hugo Chávez, Morales repartirá seu mandato com Álvaro García Linera, outrora analista político e docente universitário. O mandatário chegou à presidência da República após uma primeira tentativa, nas eleições de 2002, quando, junto com o MAS, ocupou o segundo lugar, com 20,94% dos votos, depois de Gonzalo Sánchez de Lozada (22,46%) e antes de Reyes Villa (20,41%).

Antes, o chefe de Estado foi Deputado por dois períodos legislativos; porém, foi expulso do Congresso Nacional em janeiro de 2002, acusado pelo então presidente Jorge Quiroga e pela Acción Democrática Nacionalista (ADN) de propiciar assassinatos nos conflitos de Sacaba, em 2001.

Como nunca na história democrática do país, Morales foi considerado com vários meses de antecipação o ganhador dessas eleições nacionais, instituídos na CPE. Distintas pesquisas deram-no como vencedor com uma intenção de voto entre 50 e 60%. Ao contrário, seu principal adversário, Reyes Villa, do PPB-Convergencia, manteve-se otimista até o final dos resultados, chegando até a apostar que poderia haver um segundo turno, possibilidade outorgada pela Constituição caso o segundo colocado se encontre a 10 pontos a menos do que o primeiro, sempre que este consiga 40% de respaldo.

Segundo anunciou na manhã deste domingo, o Presidente do Estado se dirigiria ao país através de uma mensagem cerca das 23 horas. Nesta segunda-feira está prevista uma reunião de análise do gabinete governamental e na quarta-feira com os dirigentes da Central Operária da Bolívia (COB), com o Conselho Nacional para a Mudança (Conalcam) e com outras organizações.

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Bolívia festeja: Cinco Departamentos somam-se às autonomias com mais de 70% dos votos

Os Departamentos de La Paz, Chuquisaca, Cochabamba, Potosí e Oruro somaram-se hoje ao bloco de regiões autonômicas após obter, cada um, o respaldo de mais de 70% de seus cidadãos, segundo dados preliminares difundidos pela rede de televisão ATB.

Em La Paz, 79,6% disseram sim à autonomia e 20,4% disseram não; em Cochabamba, 76,8% votaram pelo sim e 23,2% pelo não; em Potosí, 73,9% pelo sim e 26,1% pelo não; em Chuquisaca, 73,1% dos cidadãos votaram pelo sim e 26,9 votaram pelo não.

A partir desse novo cenário, resta somente a aprovação da Lei Marco de Autonomias, cuja tarefa corresponderá ser assumida pela Assembleia legislativa Plurinacional (atualmente Congresso Nacional). A partir da vigência dessa normativa, os nove Departamentos do país ingressarão a um novo sistema de administração.

No caso dos cinco Departamentos onde o SIM ganhou, devem proceder à aprovação de seus respectivos estatutos autonômicos, através de um referendo; enquanto que as outras quatro regiões estão obrigadas, de acordo com a lei, a adequar seus estatutos à nova Constituição Política do Estado.

O próximo passo será a eleição das Assembleias Departamentais, que acontecerá no dia 4 de abril de 2010. Além disso, nesse ato eleitoral está prevista a eleição de Prefeitos e Conselheiros Municipais.
Publicado originalmente em Adital

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Perseguição a movimentos no RS é comparada a práticas da ditadura

A Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos Humanos (CDDPH), órgão ligado à Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH), apura tentativas de criminalização dos movimentos sociais no Rio Grande do Sul. O relatório final aponta para 28 recomendações a instituições dos governos estadual e federal e para o Ministério Público Estadual. O documento foi apresentado em uma audiência pública na Assembléia Legislativa gaúcha, no dia 26 de novembro.

O texto é resultado de dois anos de investigações da Comissão, criada após denúncias do deputado federal Adão Pretto (PT-RS), morto em fevereiro, sobre a criminalização dos movimentos sociais por parte da Brigada Militar (a Política Militar do RS), do Ministério Público Estadual e do governo estadual. O trabalho foi realizado com base em ações da Brigada Militar, depoimentos de integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), da entidade patronal Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), de representantes da sociedade civil e de movimentos sociais urbanos.

De acordo o secretário adjunto da SEDH Rogério Sottili, a Comissão comprovou que houve um aumento das ações violentas da Brigada Militar a partir de 2005. Além disso, Sotilli aponta que a Nota de Instrução Operacional 006.1, instituída em 2007 no governo de Yeda Crusius (PSDB), identifica os movimentos sociais como organizações criminosas. "É a partir dessa Instrução que a Brigada Militar começa a abordar os movimentos sociais dessa forma, é de uma gravidade sem tamanho, uma gravidade que nós não assistíamos no Brasil desde a derrubada da ditadura militar, pois são práticas autoritárias, que nós, e a sociedade brasileira como um todo, não queremos mais ver no Brasil", avalia.

No documento constam também as declarações do procurador Gilberto Thums sobre o MST. Ele foi um dos promotores que aprovou um relatório do Conselho Superior do Ministério Público gaúcho que pedia a dissolução do movimento. Conforme entrevista do procurador ao Diário da Manhã, "o MST é um braço de guerrilha da Via Campesina". Para os membros da Comissão Especial, as ações de criminalização e identificação de integrantes de movimentos sociais são um atentado ao Estado Democrático de Direito.

Violência crescente

O relator do documento e coordenador-geral do Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos da SEDH, Fernando Matos, alertou que há um avanço da repressão por parte da Brigada Militar nos últimos quatro anos. Na conclusão de seu relatório, Matos aponta que há, de fato, indícios de criminalização dos movimentos sociais do campo e da cidade por parte dos poderes locais. Ele afirmou ainda que os fatos mais recentes, as torturas registradas na ação de reintegração de posse da Prefeitura de São Gabriel e o assassinato do sem-terra Elton Brum da Silva, em agosto, mostram a gravidade do problema.

Conforme o relator, desde a tragédia de Eldorado dos Carajás, em 1996, ninguém havia sido morto pela polícia em operação semelhante. "Não ocorriam mortes causadas pela polícia militar em reintegração de posse em nenhum estado desde 1996. Ao contrário, a Ouvidoria Agrária Nacional produziu um manual de reintegração de posse pacífica e mediada e a Brigada Militar foi a única polícia estadual que não assinou essa iniciativa em nível nacional. Então nós nos preocupamos bastante, porque no nosso entendimento, se há a constatação de criminalização, a gente não pode permitir que isso se aprofunde e resulte em tragédias e perdas de vidas", analisa.

Saídas

Matos aponta no relatório a necessidade da criação de uma Comissão Estadual de Mediação de Conflitos Agrários; a revogação pelo Comando Geral da Brigada Militar, da Nota de Instrução Operacional nº 006.1; a suspensão pela Brigada do processo de fichamento de lideranças dos movimentos sociais; a recomendação à Brigada que adote o Manual de Diretrizes Nacionais para Execução de Mandados Judiciais de Manutenção e Reintegração de Posse coletiva, da Ouvidoria Agrária Nacional; e a garantia às crianças dos acampamentos do MST do acesso à educação, à saúde e à alimentação. Além disso, recomenda ao Ministério Público Federal que analise a possibilidade de denunciar, por crime de tortura, os atos praticados pela Brigada Militar na madrugada do dia 12 de março de 2006.

O documento apresentado na Assembléia Legislativa ainda relata outros casos de truculência da polícia. O relatório faz referência à desocupação da fazenda São João da Armada, em Canguçu, em 2008 na qual a Brigada revida com intimidações e humilhações. No mesmo ano, foram registrados atos de violência contra os manifestantes da Marcha dos Sem Terra no Parque Harmonia, em Porto Alegre. No documento ainda estão apontados o cerco às festividades dos 25 anos do MST e a norma do Ministério Público Estadual, em fevereiro de 2009, de fechar as escolas itinerantes do movimento.

Entretanto, para o MST, as recomendações do relator não podem ficar somente no papel. De acordo com Cedenir de Oliveira, da coordenação estadual do MST, o relatório é importante, pois reafirma as denúncias que o movimento já havia feito. Mas, de acordo com Oliveira, somente o relatório não resolve o problema da criminalização. "Por um lado ele é importante, pois revela e reafirma as denúncias do movimento. Agora, não podemos esperar que somente o relatório irá resolver os problemas da criminalização no RS. Precisamos de uma postura mais ativa e neste momento nós estamos cobrando que o MPF assuma esse papel e toque adiante essas denúncias", afirma.


Por Bianca Costa, Brasil de Fato.