domingo, 28 de junho de 2009

Os passos rumo ao golpe em Honduras


Breve cronologia dos últimos acontecimentos em Tegucigalpa, sob ameaça de golpe de Estado*

Guido Eguigure
Rebelión

O presidente Manuel Zelaya (Mel) formou um governo em 2006 que desde o seu primeiro dia distanciou-se dos grupos de poder e de seus mais fiéis representantes, mantendo um poder muito frágil em relação aos setores do poder econômico e político. No Congresso Nacional ele ficou desde o primeiro momento sem uma bancada de deputados que desse respaldo aos projetos de lei que o Executivo enviava.O presidente Mel vem distanciando-se destes grupos por fazer coisas que os têm irritado profundamente: cancelou negócios que sempre foram usufruídos através da máquina do Estado. Perseguiu a evasão fiscal, uma forma de enriquecimento muito praticada pelo alto empresariado do país. Eliminou o monopólio da importação de combustíveis, que dava lucros milionários a uma única empresa. Eliminou os negócios de importação de armas e remédios que o dono de dois grandes jornais tinha feito há décadas com o Estado. Cancelou transferências mensais milionárias aos grandes meios, autorizadas a partir da casa presidencial pelos governos anteriores.
No cenário internacional desenvolveu uma política exterior diferente, aproximando-se dos governos de esquerda da América Latina.
Abriu a casa do governo aos setores populares, fazendo um tipo de auditoria social, enfrentando funcionários do mais alto nível, com pessoas simples e movimentos populares que exigem os seus direitos.Em 2008 enfrentou diretamente os deputados do Congresso Nacional em várias ocasiões, contra seu acordo para reformar a lei eleitoral, pretendendo financiar de maneira permanente os partidos políticos através do orçamento nacional – proposta que obteve o rechaço unânime da população e do Executivo. Também se distanciou do Congresso Nacional a partir da eleição da nova corte suprema de justiça, e finalmente, pela eleição do Fiscal Geral.

Estes fatos marcaram uma ruptura evidente no sistema político nacional. Foi apagada a linha divisória entre os dois grandes partidos tradicionais. Ambos se colocaram nitidamente contra o interesse nacional e contra o Executivo, que ficou quase sem representantes no Congresso Nacional.
O presidente Mel decretou um importante aumento do salário mínimo, que estava bastante precarizado devido às constantes desvalorizações e ao aumento de preço da cesta básica.
Neste ultimo ano de seu governo (2009), ano eleitoral, aprofundou-se esta divisão. Mel compensou sua falta de apoio no Congresso com o fortalecimento de uma ampla aliança com os setores populares. Isto agravou ainda mais o confronto com os grupos de poder. Os grandes meios de comunicação não passam um único dia sem atacar o governo.

Mel tem defendido a realização de uma espécie de plebiscito ou referendo nacional, para perguntar à população se ela quer uma quarta urna nas eleições nacionais de novembro. Ou seja, que além das urnas presidencial, de deputados e prefeitos, Mel quer consultar ao povo se concorda em colocar uma quarta urna para que seja perguntado ao povo se ele quer uma Assembleia Nacional Constituinte para fazer uma nova constituição. Esta proposta gerou um maremoto político. Aliaram-se os setores mais conservadores para combater ferreamente a proposta. Montou-se uma campanha midiática milionária para declarar ilegal a campanha pelo SIM, programada para 28 de junho. Utilizaram desde contestações legais até os mais baixos ataques midiáticos para desprestigiar, usando argumentos obsoletos e de atemorização massiva para evitar que a população fosse consultada. Dizem coisas como “vão levar os teus filhos” e “vão tomar as tuas propriedades”, fantasmas da guerra fria que pareciam esquecidos, para evitar que o povo fosse votar. No fundo existe um temor, frente a crescente deslegitimação sofrida pelo sistema dos partidos políticos, de que surja um novo modelo baseado mais na participação real e não na representação, que fica cada vez mais comprovado que não funciona.

Na historia recente do país, a população nunca foi consultada sobre nenhum assunto de interesse nacional.

O presidente Zelaya não enviou o projeto de orçamento de 2009 ao Congresso Nacional, de maneira que segue funcionando o do ano passado. Como forma de pressionar ao Congresso não realizou transferências ao mesmo. Isto aumentou o mal-estar dos deputados que lhe fazem posição. A maior dificuldade para eles é que este ano necessitam dos recursos públicos para que possam pagar as suas campanhas (isto é uma constatação, pois a esta altura do ano, estaríamos inundados de propaganda política. Até hoje não há quase anúncios de nenhum candidato nem para presidente nem para prefeitos ou deputados). É claro que as caríssimas campanhas dos políticos tradicionais, as quais nos acostumamos, são pagas com os nossos impostos. Do outro lado, as prefeituras têm mais de 70 exigências a cumprir para obterem os pequenos fundos designados pelo Programa de Redução da Pobreza.

Anteontem (23/6) à tarde, sofreu um grave atentado o candidato a prefeito de Tocoa (no norte do país) pelo partido de esquerda Unificação Democrática: quatro mercenários dispararam em torno de 30 balas de AK 47 contra o seu automóvel. Quatro delas atingiram o seu corpo. Ontem ele foi transportado de helicóptero para Tegucigalpa em estado crítico. Nesta mesma cidade foi assassinado Carlos Escaleras (ex-candidato a prefeito pelo mesmo partido) há mais de dez anos, caso emblemático de um dos três que estão no Sistema Interamericano de Direitos Humanos.

Para o dia de hoje, 25 de junho, o Presidente Zelaya convocou os setores populares a irem à Casa de Governo, como chamou também o Estado Maior das Forças Armadas a reafirmar o seu compromisso com a consulta. Os militares têm estado no centro da polêmica nos últimos dias porque os poderosos lhes dizem que não devem obedecer ao seu comandante geral para dar apoio logístico à consulta. Mel lhes chamou para garantir que a partir de amanhã deverão começar a distribuir as 15 mil urnas em todo o país.
Hoje à tarde circularam fortíssimos rumores de que se prepara um Golpe de Estado. As fontes são variadas, mas coincidem.

Mel se reuniu esta noite com o Estado Maior Geral e o Chefe deste na casa de governo. Ao final da reunião, numa conferência de imprensa acompanhado por representantes de variados setores populares, em um curtíssimo comunicado, Mel anunciou que tinha aceitado a renúncia do Chefe do Estado Maior Conjunto e também do Ministro da Defesa.Em seguida Mel chamou os setores populares a uma grande assembleia popular na casa de Governo a defender o direito de consulta do povo para tomar decisões importantes para o país. Já estão viajando, a caminho da capital, os setores populares decididos a respaldar o presidente.

Este episódio agrava a situação política e desafia o movimento dos grupos de poder.

Fontes confiáveis asseguram que a Junta de Comandantes e o Estado Maior das Forças Armadas decidiram renunciar em solidariedade ao seu chefe destituído.
Também se afirma que o RECABLIN (Regimento de Cavalaria Blindada, corpo de elite do exército) está pronto para tomar os pontos principais da cidade, casa de governo, rádio e canal nacional, entradas e saídas, incluído o aeroporto, etc.
Esta tarde, o Congresso Nacional se declarou em sessão permanente. Um expediente pouco usado, somente em momentos de crise. O movimento sairá daqui. Sob uma série de argumentos pseudolegais, destituirão o presidente, nomeando uma junta cívico-militar para “restabelecer” a constituição que estava em perigo.
O exército sairá às ruas para reprimir qualquer manifestação em apoio ao presidente. Será iniciada uma caça às bruxas, facilitada pela debilidade da organização dos setores populares. A violação dos mais elementares direitos estará na ordem do dia.
A única forma de evitar o derramamento de sangue será com uma contundente quantidade de pessoas nas ruas para apoiar o presidente. Meu prognóstico é que ganhará o medo da repressão e isto lamentavelmente fará com que a repressão ganhe.
Como síntese, o embaixador dos Estados Unidos saiu do país ontem. De forma muito conveniente, NÃO estará presente no desenlace desta crise.
Honduras deverá seguir jogando o papel que já jogou nos anos 80: um bloco de contenção aos governos progressistas que pressionam do Sul e que se aproximam perigosamente do muro dos fundos do império.

*Artigo publicado no site Rebelión dia 26/06, três dias antes do golpe ocorrido na manhã deste domingo, quando militares encapuzados sequestraram o presidente Manuel Zelaya na capital do país Tegucigalpa.
(tradução: Rodrigo Fonseca)
Links relacionados:

domingo, 21 de junho de 2009

Oito contra 80 mil Oito contra 180 milhões


DA Diretoria da Federação Nacional dos Jornalistas – FENAJ


Perplexos e indignados os jornalistas brasileiros enfrentam neste momento uma das piores situações da história da profissão no Brasil. Contrariando todas as expectativas da categoria e a opinião de grande parte da sociedade, o Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria, acatou, nesta quarta-feira (17/6), o voto do ministro Gilmar Mendes considerando inconstitucional o inciso V do art. 4º do Decreto-Lei 972 de 1969 que fixava a exigência do diploma de curso superior para o exercício da profissão de jornalista. Outros sete ministros acompanharam o voto do relator. Perde a categoria dos jornalistas e perdem também os 180 milhões de brasileiros, que não podem prescindir da informação de qualidade para o exercício de sua cidadania.


A decisão é um retrocesso institucional e acentua um vergonhoso atrelamento das recentes posições do STF aos interesses da elite brasileira e, neste caso em especial, ao baronato que controla os meios de comunicação do país. A sanha desregulamentadora que tem pontuado as manifestações dos ministros da mais alta corte do país consolida o cenário dos sonhos das empresas de mídia e ameaça as bases da própria democracia brasileira. Ao contrário do que querem fazer crer, a desregulamentação total das atividades de imprensa no Brasil não atende aos princípios da liberdade de expressão e de imprensa consignados na Constituição brasileira nem aos interesses da sociedade. A desregulamentação da profissão de jornalista é, na verdade, uma ameaça a esses princípios e, inequivocamente, uma ameaça a outras profissões regulamentadas que poderão passar pelo mesmo ataque, agora perpetrado contra os jornalistas.


O voto do STF humilha a memória de gerações de jornalistas profissionais e, irresponsavelmente, revoga uma conquista social de mais de 40 anos. Em sua lamentável manifestação, Gilmar Mendes defende transferir exclusivamente aos patrões a condição de definir critérios de acesso à profissão. Desrespeitosamente, joga por terra a tradição ocidental que consolidou a formação de profissionais que prestam relevantes serviços sociais por meio de um curso superior.


O presidente-relator e os demais magistrados, de modo geral, demonstraram não ter conhecimento suficiente para tomar decisão de tamanha repercussão social. Sem saber o que é o jornalismo, mais uma vez – como fizeram no julgamento da Lei de Imprensa – confundiram liberdade de expressão e de imprensa e direito de opinião com o exercício de uma atividade profissional especializada, que exige sólidos conhecimentos teóricos e técnicos, além de formação humana e ética.


A Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), como entidade de representação máxima dos jornalistas brasileiros, esclarece que a decisão do STF eliminou a exigência do diploma para o acesso à profissão, mas que permanecem inalterados os demais dispositivos da regulamentação da profissão. Dessa forma, o registro profissional continua sendo condição de acesso à profissão e o Ministério do Trabalho e Emprego deve seguir registrando os jornalistas, diplomados ou não.


Igualmente, a FENAJ esclarece que a profissão de jornalista está consolidada não apenas no Brasil, mas em todo o mundo. No caso brasileiro, a categoria mantém suas conquistas históricas, como os pisos salariais, a jornada diferenciada de cinco horas e a criação dos cursos superiores de jornalismo. Em que pese o duro golpe na educação superior, os cursos de jornalismo vão seguir capacitando os futuros profissionais e, certamente, continuarão a ser a porta de entrada na profissão para a grande maioria dos jovens brasileiros que sonham em se tornar jornalistas.


A FENAJ assume o compromisso público de seguir lutando em defesa da regulamentação da profissão e da qualificação do jornalismo. Assegura a todos os jornalistas em atuação no Brasil que tomará todas as medidas possíveis para rechaçar os ataques e iniciativas de desqualificar a profissão, impor a precarização das relações de trabalho e ampliar o arrocho salarial existente.


Neste momento crítico, a FENAJ conclama toda a categoria a mobilizar-se em torno dos Sindicatos. Somente a nossa organização coletiva, dentro das entidades sindicais, pode fazer frente à ofensiva do patronato e seus aliados contra o jornalismo e os jornalistas. Também conclama os demais segmentos profissionais e toda a sociedade, em especial os estudantes de jornalismo, a intensificarem o apoio e a participação na luta pela valorização da profissão de jornalista.


Somos 80 mil jornalistas brasileiros. Milhares de profissionais que, somente através da formação, da regulamentação, da valorização do seu trabalho, conseguirão garantir dignidade para sua profissão e qualidade, interesse público, responsabilidade e ética para o jornalismo.


Para o bem do Jornalismo e da democracia, vamos reagir a mais este golpe!

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Massacre indígena no Perú

Nos últimos dias 5 e 6 de junho a Amazônia peruana foi cenário de um verdadeiro massacre. Dezenas de pessoas foram mortas na localidade de Bágua enquanto protestavam conta o tratado de livre comércio (TLC) assinado pelo governo peruano com os Estados Unidos. O acordo prevê a exploração de recursos minerais e petroliferos na região, causando a devastação de uma área que é fonte de recursos para os indígenas. "Para nós, os povos Awajun Wampis, a floresta amazônica, é parte de nossa existência e desenvolvimento, aqui construímos nosso bem-viver: é a nossa despensa, nossa área de produção, a nossa biblioteca, a nossa farmácia, o nosso banco de sementes e de viveiros, a nossa escola. Em suma, é o nosso sentimento e cosmovisão como povo indígena. E agora está ameaçada, porque os decretos que exigimos a revogação estão feitos de tal forma que asseguram que as concessões minerais e petroleiras sigam adiante, destruam parte da floresta e contaminem as fontes de água", pontuaram as comunidades indígenas.

Para os articulistas Yvon Le Bot e Patrick Razon, "o que acontece no Peru é uma ilustração dramática de um problema que se tornou crucial em toda a América Latina: a exploração do subsolo e a devastação do meio ambiente em detrimento aos povos autóctones e à biodiversidade".

O presidente peruano se defende, afirmando ter havido um "genocídio de policiais" e não de manifestantes, e que se fosse o contrário a repercussão teria sido maior. Os dados sobre as mortes são muito díspares. O governo afirma que foram 24 policiais mortos contra 9 indígenas. Dados da Associação Interétnica para o Desenvolvimento da Selva Peruana (Aidesep) registram mais de 40 falecidos. Contudo, informações fornecidas por representantes do povo Awajun indicam que o número de mortos ultrapassa 60 pessoas, dentre elas, 30 indígenas.


Mesmo após o massacre, a resistência a exploração estrangeira dos recursos do país continua. Ontem o dia foi de mobilizações em todo o território peruano. A paralisação parcial de 24 horas convocada por entidades sindicais e movimentos populares reuniu milhares de pessoas. Em Lima, capital do país, trabalhadores marcharam pela cidade em apoio aos indígenas tendo como destino o Congresso Nacional - aonde os parlamentares vinculados ao Partido Nacionalista Peruano (PNP) tinham bloqueado as sessões de trabalho - mas foram dispersados pela polícia que lançou bombas de gás lacrimogêneo, em meio ao caos no trânsito e fechamento de comércios.

No Brasil, os participantes do Simpósio Internacional Mudanças Climáticas e Justiça Social, realizado entre 08 e 10 de junho, em Brasília, manifestaram sua indignação e repúdio ao massacre promovido pelo governo do presidente Alan Garcia. Entregaram uma Carta Aberta à Embaixada do Peru no Brasil, endereçada ao Embaixador Hugo de Zela.

Outras organizações também escreveram notas de repúdio ao ocorrido, somando-se na luta contra as tentativas de neo-colonialismo na América Latina. A Juventude LibRe manifesta sua indignação com o massacre de Bágua, e não medirá esforços para denunciar a violência do Estado peruano contra os povos que lutam legitimamente pela sua auto-determinação.

Fontes:
http://zurdo-zurdo.blogspot.com/2009/06/peru-os-indigenas-contra-o-estado-e.html
http://www.jornada.unam.mx/ultimas/2009/06/12/presidente-peruano-denuncia-201cgenocido-de-policias201d-en-la-amazonia
http://www.jornada.unam.mx/2009/06/12/index.php?section=mundo&article=026n1mun
http://www.mst.org.br/mst/pagina.php?cd=6931
Mais fotos:
http://dignidadbolivariana.blogspot.com/

terça-feira, 9 de junho de 2009

Entidades gaúchas lançam jornada contra a Violência

Na última segunda-feira (08/06) foi lançada oficialmente a "Jornada Contra a Violência e por Justiça Social 2009". Construir alternativas de políticas públicas contra violência e em busca da paz e justiça social é o desafio de 12 entidades ao promover a Jornada, que ocorrerá de 14 a 24 de junho, em Porto Alegre/RS.

A jornada se inicia com ato-show no Parque Farroupliha, no dia 14, a partir das 13h. Estarão se apresentando Vila Brasil, Dante Ramon Ledesma, Eraci Rocha, Revolução RS e Nei Lisboa. No dia 15, haverá mais uma atividade cultural, com a exibição e debate do filme “Notícias de uma Guerra Particular” com a presença do cineasta João Moreira Salles. Na ocasião será aberta a mostra de filmes “Imagens da Violência”, com sessões gratuitas de 16 a 28 de junho, no CineBancários.

Durante toda semana acontecem palestras e debates com temas como “Juventude e Violência: contexto e perspectivas”, com a participação do escritor Paulo Lins, que será realizado no Salão Nobre da Faculdade de Direito da UFRGS na quarta-feira (17/06) às 15h e “Prevenção à Violência construção de alternativas e experiências locais e nacionais” com a participação de representante do Afroreggae.

A meta também é produzir um apanhado de propostas. O documento será apresentado e discutido em uma audiência pública na Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa no dia 24 de junho, a partir das 9h30min. Inscrições podem ser feitas pelo site: www.sindbancarios.org.br.

Promoção:
Promovem o evento o Sindicato dos Bancários de Porto Alegre, Federação dos Bancários/RS, UFRGS, Sindicato dos Metalúrgicos, Sindicato dos Aeroviários, Guayí, Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário Federal, Assembleia Legislativa, Igreja Nossa Senhora da Pompéia, DCE/UFRGS, Ugeirm, Grupo de Pesquisa Violência e Cidadania/UFRGS

sábado, 6 de junho de 2009

Repressão do Governo Serra: USP amanhece ocupada pela Polícia Militar

Desde a manhã de segunda-feira, 1° de junho de 2009, o campus Butantã da Universidade de São Paulo, em decorrência de ação movida pela reitora Suely Vilela, permanece ocupado por tropas da polícia militar. O intuito dessa ocupação é impedir a realização de piquetes no prédio da reitoria, por parte de funcionários que estão em Greve há um mês, reivindicando reajuste salarial, liberdade de organização sindical e manutenção de um terço de seus cargos que estão em risco.Na mesma tarde do início da ocupação, professores transferiram suas aulas para frente da Reitoria como ato de repúdio à presença militar na Universidade, contribuindo para a retirada momentânea das tropas. Na manhã do dia seguinte, terça-feira, a polícia militar voltou a atuar no campus. Dessa vez, houve uma tentativa clara de aprisionamento de um dos dirigentes do sindicato dos trabalhadores da USP (Sintusp), que estava fazendo um piquete no centro de práticas esportivas da USP (CEPEUSP). No entanto, estudantes das três universidades estaduais (USP, UNESP e UNICAMP), em manifestação conjunta com os funcionários em greve, contribuíram para a retirada novamente da presença militar. Na manhã de quarta-feira a mesma situação verificada no início da semana voltou a se repetir: tropas policiais em frente a reitoria e manifestação de professores e estudantes contra a repressão no campus. Quinta-feira, revoltados com as atitudes antidemocráticas da Reitoria, cerca de 400 estudantes fizeram uma manifestação em frente ao prédio da Fuvest, símbolo do filtro social para entrada na Universidade. Além de interditar o portão 01 da USP, o Ato chegou a paralisar um cruzamento de uma das principais vias de acesso do bairro do Butantã. Com a chegada da tropa de choque, os manifestantes recuaram e iniciaram a organização de uma assembléia para decidir quais seriam os rumos da mobilização a partir daquele momento. Essa assembléia contou com mais de 1.000 estudantes e deliberou greve imediata. Entre as pautas gerais de reinvidicação dos estudantes estão: abaixo a UNIVESP (Universidade Virtual do Estado de São Paulo), aumento de verbas para a educação, fora PM do campus, fora Suely Vilela e eleições diretas para reitor.


Com o apoio do governo Serra, de parte da imprensa que insiste em fazer sensacionalismo das ações estudantis sem focalizar os verdadeiros motivos que levam a tais ações; e de grupos conservadores da USP, a Reitoria insiste em manter a ocupação militar no campus. Essa atitude nos faz sentir a dor de uma das mais profundas cicatrizes deixadas por um recente, fúnebre e extenso período em nossa história – a Ditadura Militar. A criminalização dos movimentos sociais, tanto na Universidade quanto fora dela, é um processo incompatível com um regime que se diz democrático. No entanto, meios de comunicação de massa e alguns membros do setor acadêmico insistem em defender tal processo. Esse triste fato nos mostra que o espectro da ditadura ainda está presente em nosso cotidiano.Contudo, é dever da juventude lutar para mudar essa realidade. A mobilização está crescente. A Juventude Libre, junto ao Movimento Estudantil, defende a livre produção de conhecimento e uma educação de qualidade, que esteja a serviço da população, como parte da luta para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Não nos renderemos frente aos setores conservadores que querem nos calar.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Adeus, General Motors - por Michael Moore

Escrevo na manhã que marca o fim da toda-poderosa General Motors. Quando chegar a noite, o Presidente dos Estados Unidos terá oficializado o ato: a General Motors, como conhecemos, terá chegado ao fim.

Estou sentado aqui na cidade natal da GM, em Flint, Michigan, rodeado por amigos e familiares cheios de ansiedade a respeito do futuro da GM e da cidade. 40% das casas e estabelecimentos comerciais estão abandonados por aqui. Imagine o que seria se você vivesse em uma cidade onde uma a cada duas casas estão vazias. Como você se sentiria?

É com triste ironia que a empresa que inventou a “obsolescência programada” – a decisão de construir carros que se destroem em poucos anos, assim o consumidor tem que comprar outro – tenha se tornado ela mesma obsoleta. Ela se recusou a construir os carros que o público queria, com baixo consumo de combustível, confortáveis e seguros. Ah, e que não caíssem aos pedaços depois de dois anos. A GM lutou aguerridamente contra todas as formas de regulação ambiental e de segurança. Seus executivos arrogantemente ignoraram os “inferiores” carros japoneses e alemães, carros que poderiam se tornar um padrão para os compradores de automóveis. A GM ainda lutou contra o trabalho sindicalizado, demitindo milhares de empregados apenas para “melhorar” sua produtividade a curto prazo.

No começo da década de 80, quando a GM estava obtendo lucros recordes, milhares de postos de trabalho foram movidos para o México e outros países, destruindo as vidas de dezenas de milhares de trabalhadores americanos. A estupidez dessa política foi que, ao eliminar a renda de tantas famílias americanas, eles eliminaram também uma parte dos compradores de carros. A História irá registrar esse momento da mesma maneira que registrou a Linha Maginot francesa, ou o envenenamento do sistema de abastecimento de água dos antigos romanos, que colocaram chumbo em seus aquedutos.

Pois estamos aqui no leito de morte da General Motors. O corpo ainda não está frio e eu (ouso dizer) estou adorando. Não se trata do prazer da vingança contra uma corporação que destruiu a minha cidade natal, trazendo miséria, desestruturação familiar, debilitação física e mental, alcoolismo e dependência por drogas para as pessoas que cresceram junto comigo. Também não sinto prazer sabendo que mais de 21 mil trabalhadores da GM serão informados que eles também perderam o emprego.

Mas você, eu e o resto dos EUA somos donos de uma montadora de carros! Eu sei, eu sei – quem no planeta Terra quer ser dono de uma empresa de carros? Quem entre nós quer ver 50 bilhões de dólares de impostos jogados no ralo para tentar salvar a GM? Vamos ser claros a respeito disso: a única forma de salvar a GM é matar a GM. Salvar a preciosa infra-estrutura industrial, no entanto, é outra conversa e deve ser prioridade máxima.

Se permitirmos o fechamento das fábricas, perceberemos que elas poderiam ter sido responsáveis pela construção dos sistemas de energia alternativos que hoje tanto precisamos. E quando nos dermos conta que a melhor forma de nos transportarmos é sobre bondes, trens-bala e ônibus limpos, como faremos para reconstruir essa infra-estrutura se deixamos morrer toda a nossa capacidade industrial e a mão-de-obra especializada?

Já que a GM será “reorganizada” pelo governo federal e pela corte de falências, aqui vai uma sugestão ao Presidente Obama, para o bem dos trabalhadores, da GM, das comunidades e da nação. 20 anos atrás eu fiz o filme “Roger & Eu”, onde tentava alertar as pessoas sobre o futuro da GM. Se as estruturas de poder e os comentaristas políticos tivessem ouvido, talvez boa parte do que está acontecendo agora pudesse ter sido evitada. Baseado nesse histórico, solicito que a seguinte ideia seja considerada:

1. Assim como o Presidente Roosevelt fez depois do ataque a Pearl Harbor, o Presidente (Obama) deve dizer à nação que estamos em guerra e que devemos imediatamente converter nossas fábricas de carros em indústrias de transporte coletivo e veículos que usem energia alternativa. Em 1942, depois de alguns meses, a GM interrompeu sua produção de automóveis e adaptou suas linhas de montagem para construir aviões, tanques e metralhadoras. Esta conversão não levou muito tempo. Todos apoiaram. E os nazistas foram derrotados.

Estamos agora em um tipo diferente de guerra – uma guerra que nós travamos contra o ecossistema, conduzida pelos nossos líderes corporativos. Essa guerra tem duas frentes. Uma está em Detroit. Os produtos das fábricas da GM, Ford e Chrysler constituem hoje verdadeiras armas de destruição em massa, responsáveis pelas mudanças climáticas e pelo derretimento da calota polar.

As coisas que chamamos de “carros” podem ser divertidas de dirigir, mas se assemelham a adagas espetadas no coração da Mãe Natureza. Continuar a construir essas “coisas” irá levar à ruína a nossa espécie e boa parte do planeta.

A outra frente desta guerra está sendo bancada pela indústria do petróleo contra você e eu. Eles estão comprometidos a extrair todo o petróleo localizado debaixo da terra. Eles sabem que estão “chupando até o caroço”. E como os madeireiros que ficaram milionários no começo do século 20, eles não estão nem aí para as futuras gerações.

Os barões do petróleo não estão contando ao público o que sabem ser verdade: que temos apenas mais algumas décadas de petróleo no planeta. À medida que esse dia se aproxima, é bom estar preparado para o surgimento de pessoas dispostas a matar e serem mortas por um litro de gasolina.

Agora que o Presidente Obama tem o controle da GM, deve imediatamente converter suas fábricas para novos e necessários usos.

2. Não coloque mais US$30 bilhões nos cofres da GM para que ela continue a fabricar carros. Em vez disso, use este dinheiro para manter a força de trabalho empregada, assim eles poderão começar a construir os meios de transporte do século XXI.

3. Anuncie que teremos trens-bala cruzando o país em cinco anos. O Japão está celebrando o 45o aniversário do seu primeiro trem bala este ano. Agora eles já têm dezenas. A velocidade média: 265km/h. Média de atrasos nos trens: 30 segundos. Eles já têm esses trens há quase 5 décadas e nós não temos sequer um! O fato de já existir tecnologia capaz de nos transportar de Nova Iorque até Los Angeles em 17 horas de trem e que esta tecnologia não tenha sido usada é algo criminoso. Vamos contratar os desempregados para construir linhas de trem por todo o país. De Chicago até Detroit em menos de 2 horas. De Miami a Washington em menos de 7 horas. Denver a Dallas em 5h30. Isso pode ser feito agora.

4. Comece um programa para instalar linhas de bondes (veículos leves sobre trilhos) em todas as nossas cidades de tamanho médio. Construa esses trens nas fábricas da GM. E contrate mão-de-obra local para instalar e manter esse sistema funcionando.

5. Para as pessoas nas áreas rurais não servidas pelas linhas de bonde, faça com que as fábricas da GM construam ônibus energeticamente eficientes e limpos.

6. Por enquanto, algumas destas fábricas podem produzir carros híbridos ou elétricos (e suas baterias). Levará algum tempo para que as pessoas se acostumem às novas formas de se transportar, então se ainda teremos automóveis, que eles sejam melhores do que os atuais. Podemos começar a construir tudo isso nos próximos meses (não acredite em quem lhe disser que a adaptação das fábricas levará alguns anos – isso não é verdade)

7. Transforme algumas das fábricas abandonadas da GM em espaços para moinhos de vento, painéis solares e outras formas de energia alternativa. Precisamos de milhares de painéis solares imediatamente. E temos mão-de-obra capacitada a construí-los.

8. Dê incentivos fiscais àqueles que usem carros híbridos, ônibus ou trens. Também incentive os que convertem suas casas para usar energia alternativa.

9. Para ajudar a financiar este projeto, coloque US$ 2,00 de imposto em cada galão de gasolina. Isso irá fazer com que mais e mais pessoas convertam seus carros para modelos mais econômicos ou passem a usar as novas linhas de bondes que os antigos fabricantes de automóveis irão construir.

Bom, esse é um começo. Mas por favor, não salve a General Motors, já que uma versão reduzida da companhia não fará nada a não ser construir mais Chevys ou Cadillacs. Isso não é uma solução de longo prazo.

Cem anos atrás, os fundadores da General Motors convenceram o mundo a desistir dos cavalos e carroças por uma nova forma de locomoção. Agora é hora de dizermos adeus ao motor a combustão. Parece que ele nos serviu bem durante algum tempo. Nós aproveitamos restaurantes drive-thru. Nós fizemos sexo no banco da frente – e no de trás também. Nós assistimos filmes em cinemas drive-in, fomos à corridas de Nascar ao redor do país e vimos o Oceano Pacífico pela primeira vez através da janela de um carro na Highway 1. E agora isso chegou ao fim. É um novo dia e um novo século. O Presidente – e os sindicatos dos trabalhadores da indústria automobilística – devem aproveitar esse momento para fazer uma bela limonada com este limão amargo e triste.

Ontem, a última sobrevivente do Titanic morreu. Ela escapou da morte certa naquela noite e viveu por mais 97 anos.
Nós podemos sobreviver ao nosso Titanic em todas as “Flint – Michigans” deste país. 60% da General Motors é nossa. E eu acho que nós podemos fazer um trabalho melhor.


Tradução: http://www.apocalipsemotorizado.net/

Originalmente publicado em:

http://www.michaelmoore.com/words/message/index.php?id=248