quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Estudantes europeus: revolta contra reformas que precarizam a educação

No transcorrer das últimas semanas, várias manifestações populares acontecem nas ruas de importantes cidades da Europa. A crise mundial passa por momento delicado e mostra reações conservadoras em muitos países, afetando diretamente o sistema de ensino em algumas regiões.


Em Roma, milhares de estudantes universitários fizarem uma manifestação contra a reforma da educação, proposta pela ministra Mariastella Gelmini. Milão e Palermo foram palco para vários confrontos com a polícia. Os universitários também bloqueram ruas de acesso aos portos em Veneza e Nápoles.
O decreto governamental já foi aprovado pela Câmara de Deputados e o Senado deve votar nesta quinta (23). A população não aceita as alterações que retiram benefícios da educação. Redução para 24 horas semanais onde antes eram 29/31, a diminuição de professores na grade, redução de mandatos dos reitores, aumento de setores privados na educação.

Assim como essas demonstrações por parte da juventude na Itália, o mesmo aconteceu em protestos no Reino Unido. Em Londres, estudantes universitários  foram às ruas contra o aumento que triplica as taxas universitárias em face a medidas que visam reduzir os impactos de individamento do Estado. O Sindicato Nacional de Estudantes informou que mais de 50 mil protestaram no dia 10 de dezembro. Segundo estudo realizado pelo sindicato, 49 universidades - o que representa 1/3 de todas universidades britanicas - estariam em risco de fechar por conta dos cortes.
O orçamento das universidades pode baixar dos atuais 3.500 milhões de libras para 700 milhões. Além disso, há ainda o plano que eleva a atual taxa de matrícula de 3.290 libras para uma cifra que pode chegar de 7.000 a 9.000.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Wikileaks: operação revanche

Centenas de voluntários e "hackers" favoráveis à pirataria na Internet realizam ataques cibernéticos em massa em apoio a Julian Assange, fundador do WikiLeaks, preso atualmente Londres.

Este grupo, que se autodenomina "Anônimos", atacou os servidores das empresas transnacionais de cartões de crédito MasterCard e Visa, bem como a página na Internet da ex-candidata republicana extremista à vice-presidência Sarah Palin.

Antes o grupo havia atacado a Igreja da Cientologia e a vários sites da indústria fonográfica, segundo o jornal The New York Times.
Os sites atacados até agora, em todos os casos, empreenderam ações que afetaram de algum modo as operações do WikiLeaks.

Os portais do promotor sueco que conduz o caso de Assange e do advogado que defende as duas mulheres que acusam o australiano também foram desativados ao mesmo tempo que o do senador estadunidense Joe Lieberman, que é um recalcitrante inimigo do WikiLeaks.

O grupo Anônimos também criou centenas de sites espelhos para que o WikiLeaks possa continuar revelando documentos secretos sem ser tirado do ar por seus atuais inimigos.

A Operação Revanche é composta por milhares de usuários que se oferecem voluntariamente para integrar uma rede clandestina controlada remotamente, denominada "botnet".

E através desta rede, os hackers conseguem inabilitar servidores em diferentes países com total impunidade, segundo o site The poet bench.com.
Outros portais que sofreram ataques foram:o site de pagamentos PayPal, o de venda de livros pela Internet "Amazon", o de um banco suíço, bem como o principal portal do governo sueco, segundo a mesma fonte.

Os ataques dos piratas rebeldes do ciberespaço afetaram seriamente todas as compras de Natal em diversos países e desataram uma onda de pânico entre diversos setores da vida política, comercial e militar, assegura a lista de e-mails actionla@lists.riseup.net.

O vírus da liberdade da Internet

Os voluntários oferecem um software que pode ser baixado por cada computador. Este software provoca o envio de mensagens simultâneas que literalmente fazem com que os servidores colapsem durante um tempo.
No caso de as autoridades policiais revistarem os computadores dos simpatizantes do Wikileaks, eles podem alegar que foram infectados por um vírus de computador de maneira casual e não podem ser penalizados legalmente por seus ataques.

A ferramenta cibernética que utilizam anuncia, uma vez que é instalada, que "agora devem se sentar comodamente e olhar o show dos efeitos que vai provocar". As possibilidades de que alguém seja preso por tê-la instalado são nulas até agora, publica a lista de e-mails austinagainstwar@yahoogroups.com.

Muitos usuários opinam que o próximo site que eventualmente será atacado é o Twitter, já que fechou unilateralmente a conta do grupo "Anônimos", denominada "Operação Anon".

Um dos representantes dos hackers, que utilizava o pseudônimo de "Sangue Frio", ou "Coldblood" em inglês, se identificou ante os meios de imprensa como um programador de 22 anos que trabalha em Londres.

Ele assegurou que "todos os portais que se submeterem às pressões desatadas pelos Estados Unidos serão alvos dos próximos ataques no ciberespaço".

O jovem disse que o WikiLeaks é mais que um site que revela documentos e denúncias, mas que também é um novo campo de batalha onde o povo pode enfrentar seus governantes.
Em um comunicado que apareceu no Twitter, o grupo "Anônimos" colocou a seguinte mensagem:

"Olá mundo, nós somos um grupo que opera no anonimato e o que saibam ou ignorem sobre nós agora é irrelevante".

“Queremos contatar a todos, aos meios de imprensa para que conheçam nossa mensagem, intenções e alvos futuros nesta campanha pacífica pela liberdade de expressão”.

“Que a internet seja para os jornalistas honestos e os cidadãos de qualquer país independentemente do que pensem ou digam”.
“Este grupo luta por vocês e a Internet é o último bastião da liberdade neste mundo em acelerado desenvolvimento tecnológico onde todos podemos nos unir e sermos fortes”.

"Por isso querem eliminar o Wikileaks e temem nosso poder quando nos unirmos. Não somos uma organização que quer fazer justiça com suas próprias mãos, nem somos terroristas. Nunca esqueçam isto", pontualizou o grupo Anônimos.

Uma acusação risível

Assange não foi formalmente acusado de nenhum delito, mas está sendo solicitado pela INTERPOL por ter supostamente mantido relações sexuais com duas mulheres de passado duvidoso, que estão vinculadas, segundo diversos meios de imprensa, aos serviços especiais estadunidenses.

Ele continua declarando-se inocente e qualificou que este caso é como uma caçada às bruxas que se intensificou desde que o WikiLeaks divulgou internacionalmente milhares dos mais sensíveis telegramas diplomáticos secretos do governo dos Estados Unidos.

Um dos advogados da equipe de defesa de Assange, Mark Stephens, disse segundo a rede Democracy Now: "O juiz do caso não viu nenhuma evidência contra meu cliente e se aprovou uma ordem de captura somente por supostamente praticar sexo sem proteção entre adultos, o que é um deboche ao sistema judicial sueco e a toda a comunidade internacional".
Stephens expressou que: "Nestas circunstâncias, acho que veremos outra nova solicitação de fiança para meu cliente e isso será somente a ponta do iceberg do conjunto de ações internacionais que planejamos executar nos próximos dias" .

O advogado também assegurou: "Isto vai generalizar-se muito cedo, muitas pessoas vão se apresentar para servir de testemunhas ao senhor Assange. Há muitos que estão convencidos de que ele é inocente e a maioria pensa que esta acusação se deve a uma manobra por motivos notadamente políticos".
O The New York Times informou que o Departamento de Justiça investiga diferentes variantes para acusar Assange, não só com a Lei de Espionagem, mas também por conspiração e tráfico de documentos secretos furtados.

Por Sivio Gonzáes, da Prensa Latina

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

No Rio, massacre e espetáculo são o novo significado de ‘segurança pública’

"Segundo a investigadora Vera Malaguti, o inimigo público número um está sendo esculpido tendo por modelo o rapaz bisneto de escravos, que vive nas favelas, não sabe ler, adora música funk, consome drogas ou vive delas, é arrogante e agressivo, e não mostra o menor sinal de resignação" (Eduardo Galeano, De pernas para o ar: a escola do mundo ao avesso).


Desde domingo passado (21/11/2010), quando surgem os primeiros incêndios de veículos nas ruas do Rio de Janeiro e a imprensa dá início à cobertura dos fatos, uma voz vem repercutindo e crescendo acima do burburinho e do bombardeio – o outro bombardeio, o das imagens, estáticas ou dinâmicas, que vêm de todas as direções. Parece existir uma esperança no ar, algo semelhante àquele sentimento que paira em final de copa do mundo, de que, desta vez, sim, a vitória está garantida!


Diz-se que a vitória em questão é a da guerra contra o crime, em especial, o tráfico de drogas, o mais hediondo de todos, encarnado pelo inimigo público nº. 1, aquele que convoca todos os ódios, medos e paixões.


Percebe-se em transmissões de rádio e TV uma entonação diferente na voz, um olhar diferente, outra respiração, uma adrenalina, certa dose de euforia, embora contida, na pronúncia de trechos inteiros de um discurso carregado de armamento mortal contra o traficante das drogas ilícitas, uma verdadeira descarga de metralhadora como esta: "Acuados centenas de criminosos, operação prossegue, 450 homens do BOPE e das polícias Militar e Civil do Rio, com apoio inédito de veículos blindados da Marinha, provocou a fuga de centena de criminosos da Vila Cruzeiro"... Tudo parece indicar um final feliz, vence o mocinho e o bandido é eliminado.


Surge no horizonte um outro Cabral que refunda (palavra que voltou à moda recentemente) um marco histórico e promete, a partir do Rio, (re)descobrir um novo Brasil em meio aos escombros da batalha contra o crime. Esse Cabral é jovem, cheio de testosterona, como todos os corpos machos envolvidos, heróis ou bandidos desta guerra. Chama a bandidagem para a briga, diz que não vai recuar, não tem medo de terrorista. A ênfase que a imprensa tem dado a esse Cabral não é a de líder de um governo estadual com "estratégias bastante distintas do padrão vigente", como Cláudio Beato escreveu na Folha de São Paulo (26/11/2010, página A-3).




Estão dizendo na TV que os brasileiros querem blindados e tanques de guerra para defender a "sociedade dos ataques dos criminosos". E esses brasileiros existem e para nos provar sua existência são levados para a tela da TV. Formam, certamente, a tal maioria numérica (grupo que, sozinho, está em quantidade superior à metade do grupo inteiro) necessária para emplacar um plebiscito pela pena de morte, por exemplo. Despontaram na telinha pessoas que estão acreditando nisso, precisam acreditar, que as Forças Armadas vencerão a guerra contra o tráfico. Houve um cidadão que chegou a manifestar expressamente sua crença de que "no fim, o bem vencerá o mal". O que estão pedindo os moradores das próprias áreas ocupadas pelas tropas e blindados? Exatamente isso, tropas e blindados! Nunca a voz da favela ecoou tão diretamente ou repercutiu de forma tão imediata junto ao Poder Público. Vocês querem o BOPE? Vocês querem o exército e a marinha? Pois tomem BOPE, tomem exército, tomem marinha! Não é a segurança um direito do cidadão? Na linguagem mercadológica: satisfação total do cliente! As mortes de crianças, idosos, jovens, homens e mulheres não diretamente envolvidos são efeitos colaterais do combate necessário.


Ora, mas essa é a fala dos que querem fazer da segurança pública a máquina para matança de brasileiros pobres, traficantes ou não traficantes, bandidos ou mocinhos! Esse discurso pode se voltar facilmente contra UPPs, contra polícia cidadã, pode minar condições para construção de qualquer coisa distinta do BOPE e reverter as possibilidades de tratamento da questão da violência na linha dos direitos humanos.


Hoje eu ouvi no rádio um comentarista dizendo que Forças Armadas são treinadas para matar o inimigo e, portanto, "se todos querem as Forças Armadas nesse conflito, que depois não venham chorar os cadáveres espalhados".


Sinto-me mal, dói a cabeça, o estômago arde, fico indignada... Discuto sozinha na sala, em frente à TV... O Merval Pereira também entende de segurança pública! Estamos salvos... E eu que nem sabia dessa... Já cheguei a pensar que ele era o dublê de voz do Alf, o ETeimoso , mas – quem diria! – não sabia de sua expertise em estratégias contra o crime. Acaba de sugerir o corte de todo e qualquer tipo de comunicação, com o mundo externo, dos líderes do tráfico que saíram de Catanduvas para Porto Velho.


E se a queima de automóveis não for por causa das UPPs? E se as milícias tiverem uma função mais importante nesse cenário?


Entretanto, não é implausível que traficantes dos morros do Rio reajam desta forma se estiverem diante da dificuldade de sobrevivência dos pontos de comercialização da cocaína ou, pior, na iminência de perder o controle sobre a venda da droga proibida.


(Aos traficantes "incluídos", aptos ao exercício do consumo graças ao negócio lucrativo da cocaína, não interessa a descriminalização, porque outra é a lógica do mercado lícito, onde reassumirão o status de simples excluídos da ordem legal – dominada que é pela elite financeira, pelos ricos que podem consumir qualquer droga ilícita ou comercializá-la impunemente).


Como será que reagiriam, por exemplo, os empresários do fumo e do álcool se, por qualquer razão, absurda razão, fossem ameaçados de perder seu business? A diferença entre ambos, além, é claro, do selo de licitude/ilicitude do produto comercializado, é que o primeiro negócio gera muito mais dinheiro e movimenta uma outra indústria da morte, a das armas e munições.

Algum dia talvez se possa desmanchar esse falso consenso de que o proibicionismo penal, com a produção de cadáveres, culpados ou inocentes, vai derrotar o tráfico e deixar o Rio de Janeiro – e o resto do mundo – livre da droga. Hoje já se percebe alguma tolerância em relação à maconha, fala-se em consumo recreativo de maconha na Califórnia, a maconha é cultivada na Califórnia. Está deixando de ser negócio de índio e está virando negócio de branco. Não demora a sair a legalização...

Essa guerra não é nossa. Não é carioca, não é brasileira e nem sulamericana. Que me desculpem certas personagens da nova esquerda punitiva, limpinha, engomadinha e que não fala palavrão, é injustificável o investimento de tantos recursos a serviço na eliminação física dos pobres. Massacre não significa mais segurança pública, é apenas o serviço do business dos equipamentos e tecnologias de segurança produzidos pelos países ricos. Essa guerra não existe para acabar com a droga. Jamais terá fim essa guerra infinita. Somente pausas, tréguas, intervalos. É para ser consumida no formato novela, seriado. Trata-se da guerra pela guerra, um outro bom negócio que não pode acabar, neverending war...




Produto altamente rentável no mercado, a guerra também é sensacional. Ela consome armamento e tecnologia e vende cinema, novela, jornal, cultura para a massa. Imagens reais e fictícias. A guerra vende sensação. No fim, a guerra é do mesmo partido que a droga, o partido da sensação, ela promete o mesmo que a droga.


Ainda pior que o consenso da lógica beligerante no terreno das drogas é a impossibilidade do dissenso – arrogante, violenta e antidemocrática. Por que não discutir princípio de segurança pública, ao invés de alimentar o espetáculo produtor de ethos heróicos e guerreiros, papéis historicamente destinados aos eternos derrotados, de ambos os lados, dessa estúpida guerra, os jovens pobres que vêm do mesmo lugar, uns para serem policiais e outros para serem bandidos? Não, isso não é um set de filmagem, isso é real.


É real o fogo marginal que se espalha pelo asfalto fazendo vítimas de verdade. Não é faz-de-conta o fogo oficial que sobe o morro para deixar mais corpos no chão. Ao final, a luz não vai se acender, não haverá cortinas a se fecharem sobre uma grande tela escura por onde desfilarão os créditos da obra. Não, não haverá um fundo musical, enquanto nós, passivos espectadores, mudamos de canal, do jornal nacional para a novela das oito, com a agradável sensação de que é o mundo que está mudando para melhor (ou para pior, quem sabe?). O depois será o saldo da violência, a morte, a dor, a intensificação do ódio, na sequência, o esquecimento e, com ele, outros jovens, pobres e negros, retomarão os postos dos bandidos mortos. A guerra continua, já pode recomeçar.


Essa queima de carros e ônibus praticada no palco social visível da classe média pede uma resposta imediata, é verdade, uma reação pronta, de força e manutenção da ordem. Mas é pontual, uma reação momentânea, porque não dá para transformar as forças armadas na força de segurança das cidades brasileiras, seja o Rio ou qualquer outra. Irmão invisível, grande irmão que nos vê a todos, anjo do bem que abre para nós suas janelas de ver o mundo, deixe-nos em paz com nosso sofrimento. Não nos queira convencer que essa guerra é boa, que é a única saída possível e vai nos livrar de todo mal da droga para sempre, amém.

A discussão pública corre o risco de seguir, mesmo depois do fim das recentes eleições, a mesma linha estúpida, simplificadora e maniqueísta entre o bem e o mal, no caso, a guerra ou a droga. Por favor, que se respeite ao menos o direito que as minorias (grupo que, sozinho, é menor que a metade do grupo inteiro) têm ao disssenso! 






Beatriz Vargas Ramos é advogada; foi professora assistente de Direito e Processo Penal da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e atualmente leciona na Universidade de Brasília (UNB).